Roberto Amaral pertence à elite dos grandes
pensadores do Brasil. Cientista do Direito e do Estado, arauto do Socialismo e
da Democracia e militante político de esquerda, que conhece o papel do
intelectual e as suas relações diante das coisas do poder, é orgulho da nossa
cultura política e social.
No nosso livro El Pensamiento Político de Paulo Bonavides, lançado em fevereiro de
2010, na Universidade de Puebla, deixamos registrado que “Roberto Amaral, desde
muito cedo, tracejou os caminhos da sua formação no campo da esquerda e da
militância política democrática”.
E, tendo em vista o seu livro Textos Políticos da História do Brasil
(Fortaleza: Imprensa Universitária, 1973), publicado em parceria com Paulo
Bonavides, afirmamos o seguinte: “Se Paulo Bonavides abraçou o Direito
Constitucional e a Ciência Política, Roberto Amaral se fez um militante
político aguerrido, um líder socialista respeitado e um jurista e pensador do
Estado dos maiores que o Brasil produziu no século precedente”.
Quando nos encontramos pela primeira vez, em
1990, Roberto Amaral demonstrou o empenho com que lera o nosso livro A Metáfora do Sol (1989, 5ª ed.
Fortaleza: Edições Poetaria, 2014) e de como estava consciente da nossa
militância e do nosso desejo de construir no Ceará uma ideologia política de viés
democrático.
Referência histórica do PSB nacional
e da sua secção no Ceará, Amaral era o guru de todos e de cada um de nós que
acreditávamos nesses ideais, ponderando sempre a necessidade de que não
viéssemos a perder a estratégia, a discussão e o diálogo com os demais partidos
de esquerda.
Na época em que era Ministro da Ciência
e Tecnologia, lançou um dos seus livros no Ceará (Em Defesa da Utopia, 2006), e fomos convidados a fazer a
apresentação. Outros livros de sua autoria foram editados nesse período
riquíssimo da sua produção, entre os quais, destacamos: O Papel do Intelectual na Política (Fortaleza: Edições Demócrito
Rocha, 2005).
Nesse
último livro, mostra-nos Roberto Amaral que o debate acerca do militante
político deve ocorrer, necessariamente, à margem da organização do Estado,
especialmente porque o Governo não deve se confundir com o Partido, e porque o
Estado é bastante diferente do Governo que o concretiza.
Algum tempo depois, Roberto Amaral voltou a
Fortaleza, para receber a Comenda do Mérito Parlamentar cearense e lançamento
de dois novos livros: Socialismo &
Democracia e Ciência, Tecnologia e
Soberania Nacional, frutos da sua pena de cientista e de esteta, de
pensador das coisas da Política e de intelectual que se perfaz pela riqueza dos
seus conhecimentos; e, mais uma vez, fomos convidados a fazer a apresentação do
homenageado.
É bastante original a sua abordagem
em Ciência, Tecnologia e Soberania
Nacional (Brasília: Gráfica do Senado, 2010), porque em suas páginas
enfrenta a questão da ciência e tecnologia e sua correlação com o projeto
nacional, à margem das imposições do imperialismo e do capitalismo,
esclarecendo-nos: a) que a globalização não determinou o fim das fronteiras
geográficas; b) que a Democracia não se coaduna com o monopólio do mercado; c)
que a competitividade não se confunde com a abertura econômica unilateral; d) e
que a defesa da paz não implica o desmonte da ordem nacional, nem a renúncia da
soberania e da autodeterminação.
Socialismo
& Democracia (Brasília: Fundação João Mangabeira, 2011) constitui o
título do segundo livro de Roberto Amaral. Trata-se de um de seus testamentos,
porque se destaca entre os seus maiores livros editados, tais os clássicos: Intervencionismo e Autoritarismo no Brasil
(1975), Crônica dos Anos Geisel
(1987), Introdução ao Estudo do Estado e
do Direito (1990) e Não Há Noite Tão
Longa (1996), este último, um dos marcos da literatura brasileira da sua
geração.
A temática de Socialismo & Democracia é plural e diversificada, mas, na
essência, o livro constitui uma reflexão e um argumento filosófico sobre o
destino da democracia e a sua práxis,
tendo-se em vista a sua pragmática, em face do consenso que o neoliberalismo
impôs ao despreparo da esquerda e à sua falta de visão cultural e hegemônica.
A
tomada do poder, antes da conquista da hegemonia, deslumbrou no Brasil os
partidos de esquerda e o consenso reformista da sua pontuação programática,
levando um governo de viés populista, durante quase uma década, a seguir as
imposições do mercado e a tratar o Parlamento, não pelas vias da negociação, em
vista as demandas sociais, mas em face, sobretudo, dos interesses neoliberais.
A esquerda, portanto, defendendo
bandeiras que nunca foram suas, tais como o moralismo, o combate à inflação e a
busca da estabilidade monetária, para assegurar a tranquilidade do sistema
financeiro e deixar o mercado plenamente feliz e satisfeito.
Para Roberto Amaral, “a democracia
representativa, de índole ocidental, mais e mais se configura como uma farsa,
defraudando a soberania popular, em face do crescente deslocamento dos centros
de poder (e de decisão) do Estado para a grande empresa, nacional e
internacional”.
O que está em jogo, especialmente nos
países de pouca densidade educacional e de quase nenhuma consciência política
ou partidária, como é o caso do Brasil, é a substituição da política pela
ditadura do mercado, de forma que as privatizações largamente combatidas, mas
utilizadas pelos partidos de esquerda, expressam a falência das suas proposições
e das suas bandeiras partidárias.
Ainda para Roberto Amaral, a saída
do impasse seria aparentemente simples, consistindo na retomada das raízes
históricas da esquerda, e na assimilação do seu papel transformador, e tendo
como meta, especialmente no Brasil, a construção coletiva, com a sociedade, de
um projeto nacional, de bases populares e respaldado pelas exigências do
desenvolvimento.
Por último, gostaríamos de endossar
o pensamento do autor, no sentido de que “a democracia que nós socialistas
defendemos é a democracia participativa, em busca de um Estado pluralista e de
uma sociedade aberta a projetos associativos”; e de que “no quadro das crises,
característica das esquerdas brasileiras, a conjuntura revela o desconforto
resultante da incapacidade de formular uma teoria que explique e oriente a
prática de governo numa realidade ideológica adversa”.
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