terça-feira, 28 de outubro de 2014

Albert Camus - O Estrangeiro



                Dimas Macedo


             Publicado em 1942, O Estrageiro é o mais conhecido romance do escritor francês Albert Camus. O livro foi decisivo para que o autor recebesse o Prêmio Nobel de Literatura, e foi adaptado para o cimnma pelo cineasta italiano Luchino Visconti, em 1967.
             Escrito durante a Segunda Guerra Mundial, o romance foi desenvolvido a partir de uma  atmosfera alegórica, reavivando nos seus leitores aquilo que existe de mais trágico na condição humana: o absurdo, os limites que nos impedem fruir a liberdade e tornar a realidade algo que possa estar ao alcance de todos.
            Essas aspirações do autor, que nos colocam diante das grandes interrogações, foram questionadas em toda a sua produção literária, exacerbando-se, especialmente, nos romances A Peste e O Primeiro Homem, nos ensaios de O Mito de Sísifo e O Homem Revoltado e na novela intitulada A  Queda, sendo esta última um libelo contra o absurdo e a indiferença que rondam o nosso desejo de viver em plenitude.
             Meursault, o protagonista de O Estrangeiro, vive em estágio de indiferença diante de todos os valores morais. Trata-se de personagem que não aceita as regras do jogo e está disposto a ir até o fim, defendendo a única verdade na qual acredita.
              Considerado, por muitos, como alter ego do autor, Meursault nasceu para desmascarar o cinismo, a hipocrisia e o vazio que encobrem o sentido real da existência, e que ofuscam a beleza da vida e o emaranhado das nossas relações no plano social. 
             Albert Camus expõe a impotência das pessoas diante das suas desgraças e das misérias cotidianas que presenciam e que fingem não estar vendo, e O Estrangeiro aponta para o que existe de estranho na nossa identidade, tudo isso através de uma linguagem concisa e de frases curtas e incisivas que chamam a atenção do leitor.
             Justamente para dissecar aquilo que constitui o nosso erro fundamental,  e abrir os nossos olhos para os delitos da insensatez, da insensibilidade e das linguagens e regras morais que modelam a nossa existência, é que a obra de Albert Camus foi escrita. 
             Nos seus romances, ensaios e peças de teatro, o autor nos coloca diante dos grandes dilemas filosóficos. Os seus livros foram traduzidos para mais de quarenta idiomas e Camus vem sendo apontado como o escritor mais disputado por leitores jovens,  especialmente pelos leitores de livros em formato de bolso. 
              Considerado um dos maiores escritores de todos os tempos, Albert Camus é autor de uma escritura simples e elegante, que prima pela clareza e a concisão, sendo seus livros condensados em pequenos volumes e em linguagem direta e sem sofisticação. Vale a pena, assim, mergulhar na sua leitura.

Meu Irmão Rivaldo Macedo

             Dimas Macedo

 

         O meu irmão Rivaldo Macedo, conhecido, popularmente, em Lavras da Mangabeira, pelo nome de Rivaldo Lobo, foi um ser humano extraordinário, que veio ao mundo para servir e se colocar a serviço do bem.

          Nasceu, assim como eu e a maioria dos meus irmãos, no Sítio Calabaço, a nove quilômetros da cidade de Lavras, aos 6 de setembro de 1946, e faleceu na sua residência, no bairro Além-Rio, na mesma cidade, aos 9 de maio de 2000.

          Era filho de José Zito de Macedo (Zito Lobo) e de Maria Eliete de Macedo, e neto, pelo lado paterno, de Maria de Aquino Furtado e de Antônio Lobo de Macedo, antigo vereador à Câmara Municipal daquela localidade.

         Tinha uma ligação muito forte com os seus parentes e os seus ancestrais do Sítio Calabaço, especialmente, com os nossos avós, pelo lado materno, José Furtado de Macedo (Pai Zé) e Maria das Mercês Macedo (Maezinha).

         Estudou no antigo grupo escolar da sua cidade natal e no Colégio Agrícola Professor Gustavo Augusto Lima. Contudo, profundamente inclinado para as atividades agrícolas, abandonou os seus estudos para dedicar-se à vida rural e ao criatório de animais.

        Viveu a sua infância no Sítio Calabaço, depois, na cidade de Lavras e no Sítio Cajueiro, cuidando, igualmente, dos seus afazeres de empresário rural na Fazenda Riachão, que pertencia a pessoas de sua família e que passou, com o tempo, para o seu domínio, onde construiu duas residências e dois açudes, cujas estruturas, ainda hoje, evidenciam o seu senso de organização.

        Em Lavras da Mangabeira, Rivaldo tornou-se um respeitado agropecuarista, destacando-se também como vaqueiro, especialmente por suas participações em vaquejadas nas quais atuou com as suas iniciativas e os valores da sua inteligência.

        Dotado de grande generosidade e de reconhecido carisma social e político, sobressaiu-se pelos serviços prestados à sua comunidade e aos moradores do bairro Além-Rio, do qual foi um dos civilizadores, ao lado do seu tio Joary Lobo, que foi vereador, presidente da Câmara Municipal e vice-prefeito daquele município.

       Preocupado com o desenvolvimento agropecuário do seu município, engajou-se em várias iniciativas políticas, sendo sido, inclusive, presidente da Cooperativa Agrícola de Lavras da Mangabeira.

        Em sua terra de berço, os acertos da sua retidão moral e a sua dedicação à causa dos seus semelhantes serviram de exemplos à sua comunidade: a todos aconselhando, a todos ajudando e com os pobres dividindo os frutos do seu trabalho e da sua reputação.

         Hoje o seu nome está afixado na praça do bairro onde mais atuou, e a estrada-avenida que liga o Além-Rio à sua antiga residência também leva o seu nome. Referida avenida, para a minha alegria, é a extensão da rua em homenagem ao nosso venerado pai, cuja legenda cultuamos com respeito e admiração.

      Orgulho-me não apenas dessas iniciativas prestadas à memória do meu irmão Rivaldo Macedo, mas de tê-lo na conta de um grande amigo e do irmão a quem mais me liguei, pelos laços da emoção e do afeto e pelos fervores do amor e da generosidade.


quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Vasco dos Santos - O Solitário da Montanha

      Dimas Macedo

 

          A arte que tem o dom de transformar as partituras de fogo da solidão e do afeto, para aí edificar um reino de luz e de beleza, onde a palavra e a imagem constituem os achados antológicos de maior relevo, só podia mesmo sobreviver a todas as idades do homem e chegar até nós de forma exuberante e serena.

           A literatura é essa arte ancestral e mitológica, porque contemporânea do homem primitivo e do homem de todas as idades, das religiões fundadoras da verdade e de todos os cenários de ressurreição dos devaneios humanos e de suas veladas esperanças.

           Os poemas heroicos das civilizações primitivas, as fábulas com que no passado os ensinamentos foram transmitidos, as gestas medievais, o teatro de destinos cruzados com que os gregos tanto se bastaram, os romances de cavalaria, os tratados filosóficos de todas as utopias políticas, o romance burguês e de costumes sociais dos séculos dezoito e dezenove são exemplos de literatura que se fez para a glória dos valores mais afortunados.

           O romance é, por essência, o gênero de maior ambição no plano literário. Enquanto a poesia se faz com a estética do fragmento e da linguagem, o romance é construído com a forma, o conteúdo e a visão de mundo dos escritores mais afortunados. O romance se perfaz desde a unidade dos arquétipos sociais e psicanalíticos e da expressão com a qual se tecem os fios de ouro da semântica.

          Um romance se faz com estruturas relacionais e com enredos polifônicos e também com gestos e ações de sentido filosófico, quando se trata, é claro, de um romancista de talento. Existe um movimento no romance que somente o romancista compreende em um primeiro momento.

          No entanto, quando o autor de um romance é, ao mesmo tempo, criador de outros universos, gêneros literários e polifonias para além da dispersão e da unidade do ser, como é o caso dos poetas e dos que sabem a arte do pensamento por imagens (ensaístas e críticos literários de maior estofo), é claro que desse autor podemos esperar o melhor.

          E o melhor, acredito, é aquilo que colhemos do romance O Solitário da Montanha (São Paulo: Nova Aldeia, 2005), última criação de Vasco dos Santos, um dos maiores arautos do romance histórico e do mar salgado da escrita na literatura de língua portuguesa.

         E o que documenta esse romance maduro de Vasco dos Santos? Uma história de amor e heroísmo, uma história de movimento e de ação do espírito, posicionada contra os contextos arcaicos da imensa violência do mundo. Somente a vida, louvada desde a solidão dos que amam, faz sentido nesse romance de enredo sublime, cuja leitura recomendo com entusiasmo.

         Não é feita de matéria bruta a sua tessitura, nem de discursos formais enfadonhos é construído o enredo exemplar dessa narrativa. O autor, ao contrário, a escreveu com as tintas da paixão e a ungiu com a sintaxe da solidão e do desejo, fiel ao seu ideário de esteta e à sua vocação de escritor.

          Resta-me dizer uma palavra acerca do enredo desse grande romance e dessa sinfonia estilística, que tanto me tocou a emoção e o engenho, que tanto me curou da intensa agonia de viver com o seu extraordinário poder de catarse e de efeitos visuais e sinérgicos que se leem no seu articulado.

           Se aqui fosse somar o talento do escritor que arquitetou esse livro com a erudição que sempre remarcou a produção do romancista, do ensaísta e do poeta que se harmonizam na personalidade singular de Vasco dos Santos, creio que teria motivos para dizer que estamos diante de um dos nossos maiores escritores.

            Lícito não me seria, também, silenciar acerca da claridade estética desse livro, aí incluindo-se a sua leveza e concisão de linguagem, a sua disciplina formal e o seu diversificado conteúdo.

            Fica aqui a recomendada a necessidade da sua leitura: imperdível, humana, maneirosa, sutil e desafiadora, sob qualquer ângulo em que o romance e o seu argumento possam ser examinados, para o triunfo da literatura que hoje se pratica no Brasil.


                                                                                   Fortaleza, 2005


sábado, 4 de outubro de 2014

Nuntia Morata

                 Dimas Macedo
 
                    O gozo do signo é, talvez, o ponto mais alto para o qual aponta a ordem do discurso. Os caminhos da linguagem são intrincados, e por qualquer atalho terminamos sempre em um labirinto. O símbolo não liberta a linguagem do seu absoluto; antes, ele a transforma em prisioneira do mistério.

              Dois planos de compreensão do mundo e do homem existem no campo da crítica literária: o prazer da leitura e a sua reconstrução e utilidade, tendo-se na intuição e na sensibilidade do crítico os seus elementos de maior alcance.

              A crítica é o gênero mais alto de todas as formas de criação. É poética no sentido aristotélico e nos usos que lhes foram dados pela invenção do ensaio e pela dialética com que os códigos literários foram reabertos desde a Idade Moderna.

              O Poema, a forma literária mais retrabalhada ou reconstruída durante o curso da história, somente chegou até nós, acredito, porque a crítica intuiu a perspectiva da sua morfologia e da sua semântica, deixando para a linguística os seus elementos de ordem sociológica.

              O exercício da crítica literária exige erudição e domínio do conhecimento de quem se aventura pela sua seara, por sua sedução prazerosa e pela sua pluralidade de sentidos. Não podemos comparar a crítica com os comentários apressados e com as resenhas corriqueiras de jornais e revistas.

              A produção da crítica exige do seu autor o seu fervor analítico, a sua perspectiva sócio-literária, a sua visão de conjuntura e a sua formação no campo da cultura artística, associada ao rigor do método.

             Vianey Mesquita, o autor de Nuntia Morata – Ensaios e Recensões (Fortaleza, Expressão Gráfica, 2014), é um dos melhores críticos literários que conheço. Arquiteto a Posteriori da criação literária e mestre nos domínios da correção da língua e da gramática, no Ceará poucos a ele se igualam em erudição e humildade diante das estruturas do texto.

              Hermeneuta da Literatura por imperativo da sua formação, é um decifrador humorado do texto literário ou do texto científico que desvela, pois não lhe faltam argúcia e preparo para enfrentar os diversos códigos da linguagem.

              Enquanto escritor, Vianey Mesquita prima pela correção gramatical, mas é sagaz com os recursos do seu golpe de vista, restaurando a precisão do método e a analogia filosófica e científica da escritura acadêmica por ele examinada.

              A sobreleitura do texto literário, sociológico, filosófico ou científico por ele empreendida, encontra-se permeada de um fino lavor artesanal, revestida da melhor recepção e rematada pela estética da síntese e da claridade, e tanto mais escandida pelo gozo do signo e da pontuação.

                  E de forma que Nuntia Morata, a sua nova coroa de ensaios, é a escansão melódica do seu estro, porque de música e de estilo primoroso são costuradas as suas intenções e remarcadas as suas entrelinhas.