sábado, 26 de janeiro de 2013

A Poesia, a Ética e o Supremo


                  Dimas Macedo


O Ministro Carlos Ayres Brito,
 o Poeta Dimas Macedo
 e o advogado tributarista Pablo Macedo

               Desde a época da filosofia grega de linhagem socrática, vige, no plano da vida, a norma de caráter ético com a qual a dignidade se consola. A atitude de Sócrates, diante das seduções materiais e das tiranias do poder, mostra-nos que o equilíbrio social e individual pertence à conduta interior, ao livre-arbítrio e à capacidade que tem o ser humano de defender o triunfo do bem.

             É feliz quem tem a capacidade de ser livre, de decidir não de forma favorável ao poder, mas de forma favorável à Ética e à Justiça a partir da sua dimensão proporcional e equitativa.

            Boa parte dos magistrados e dos detentores do poder, desde os primórdios da civilização, têm-se revelado seres potencialmente corruptos e tresloucados pela perda da clarividência, tais os casos de juízes e chefes de Estado que, renunciando às suas trajetórias, assumiram a falta de postura ética como modelo de sua atuação.

            Mas não é isso o que constrói a continuidade da vida, cuja energia renasce e se transforma a partir das atitudes dos homens de boa vontade. E nesse sentido, parece sintomático constatar  que a geração que assistiu a promoção da mentira e degradação da política por parte de Luiz Inácio, foi a mesma que passou a conviver com a consciência ética elevada de Carlos Ayres Britto, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal.

           Ayres Britto, antes de ser o magistrado ético e incorruptível que assustou a conduta de muitos integrantes do Judiciário, abraçou as vozes da sua consciência e se deixou levar pelas razões da Ética e da Justiça, contrapondo-se à farsa e à corrupção defendidas por muitos políticos brasileiros.

            O seu triunfo como magistrado e a difusão da sua consciência e da sua retidão, por todos os quadrantes do Brasil, são resultados da sua conduta exemplar e da sua defesa do Supremo Bem e do Supremo Tribunal Federal.

            Carlos Ayres Britto não é apenas um grande jurista e um grande magistrado, mas um dos melhores poetas do Brasil, cuja trajetória encontra-se pautada na ética e na conduta contra a discriminação e o preconceito.

          Orgulho-me, profundamente, de conviver com Carlos Ayres Britto, de ser seu amigo leal e desinteressado, e de poder proclamar que esse sensível poeta brasileiro é a encarnação da verdade e das forças espirituais do bem.

           Assim como Ayres Britto, não acredito no triunfo da corrupção, mas na serenidade da vida que se arma a partir da voz interior. A Poesia, a Dignidade, a Ética e a Justiça têm em Carlos Ayres uma de suas grandes representações.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

sábado, 19 de janeiro de 2013

Filgueiras Lima - Set de Filmagem

 
 
 
 
                                                             

 Dimas Macedo no topo da Serra do Boqueirão,
 em Lavras da Mangabeira (CE), no Set de Filmagem
 do vídeo Filgueiras Lima - Poeta e Educador,
 vendo-se a jusante  a cauda do Rio Salgado,
principal afluente do Jaguaribe, pela margem esquerda.


 


O poeta Dimas Macedo, a socióloga Peregrina Campello
e o cineasta Henrique Dídimo
 em frente à Igreja de São Vicente Ferrer,
em Lavras da Mangabeira (CE),
no Set de Flmagem do vídeo
  Filgueiras Lima - Poeta e Educador

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Perfil de Joaryvar Macedo

             Dimas Macedo

                                                             Joaryvar Macedo por Geraldo Jesuino


           Falar da personalidade e, principalmente, da obra literária e historiográfica de Joaryvar Macedo constitui tarefa que dignifica e ao mesmo tempo põe em desafio a argúcia do intérprete, vez que estamos a tratar de um homem de letras que “notabilizou-se como um dos mais autênticos pesquisadores da história do seu Estado”.

Considerado por Raimundo Girão como sendo “o mais abalizado historiador do sul do Ceará”, Joaryvar Macedo nasceu no Sítio Calabaço, a oito quilômetros da cidade de Lavras, aos 20 de maio de 1937, sendo filho de Antônio Lobo de Macedo, poeta popular e político influente em seu município, e de Maria Torquato Gonçalves de Macedo.

Na terra natal estudou as primeiras letras com as professoras Teresita Bezerra, Irony Gonçalves, Adelice Macedo e Nícia Augusto Gonçalves, entre outras. Posteriormente, foi aluno do Seminário Diocesano do Crato e do Seminário Arquidiocesano de Fortaleza, cursando inclusive Teologia nos Seminários Arquiepiscopais de Olinda, Recife e João Pessoa. 

Em 1965, ingressou na Faculdade de Filosofia do Crato, por onde licenciou-se em Letras, colando grau aos 7 de dezembro de 1968, sendo na oportunidade orador oficial da turma, possuindo ainda curso de pós-graduação em Metodologia do Ensino Superior pela Universidade Católica de Salvador.

                Depois de formado, abraçou a carreira do magistério, como professor da Faculdade de Filosofia de Crato e de vários estabelecimentos de ensino de Juazeiro do Norte. Ensaísta e historiador, em 1974 fundou o Instituto Cultural do Vale Caririense, que dirigiu por mais de uma década e do qual foi aclamado presidente perpétuo, dedicando-se, como pesquisador, aos estudos da formação étnica, histórica e cultural do Cariri.

              Sendo admirável “a extensão de sua cultura e a perseverança de suas linhas de pesquisa, qualidades que escondia atrás de uma personalidade simples e de aparência tímida”, como bem acentuou o escritor Murilo Martins, o certo é que Joaryvar Macedo, “revelando uma excepcional tendência para a pesquisa histórica, sua atuação nessa área logo  se  mostrou  tão  ampla  e profunda, que se passou a ver na projeção do seu trabalho um desdobramento da escola instaurada por Irineu Pinheiro e padre Antônio Gomes de Araújo, fixando-se neste último a sua linha de ação”, consoante a observação de F. S. Nascimento.

              Sobre a evidência de ser Joaryvar Macedo o representante mais legítimo e o mais profundo continuador da escola histórica do Cariri, em 1984, no meu livro Leitura e Conjuntura, eu já havia afirmado o seguinte com relação à sua envergadura de intelectual:

               “Joaryvar Macedo é um escritor inquieto, porém um homem polidamente tratável. É valor maior das letras sul-cearenses no momento atual, porque, quem começar a leitura da história da Região Caririense pelas obras de Irineu Pinheiro, e resvalar pelos ensinamentos do padre Antônio Gomes de Araújo, terá fatalmente que ancorar nos seus trabalhos históricos sobre a conquista, o povoamento e a formação étnica e social do ubertoso vale”.

               Além de farta produção esparsa em jornais e revistas do Ceará e de outros Estados, publicou Joaryvar Macedo os seguintes livros: Caderno de Loucuras 1965; Discurso de Orador Oficial da Turma (1968); Apresentação de Fagundes Varela (1971); Os Augustos (1971; Otacílio Macedo (1972); Um Bravo Caririense (1974); O Poeta Lobo Manso (1975); Templos, Engenhos, Fazendas, Sítios e Lugares (1975); A Estirpe da Santa Teresa (1976); Pedro Bandeira, Príncipe dos Poetas Populares (1976); Fagundes Varela e Outros Rabiscos (1978); Influência de Portugal na Formação Étnica e Social do Cariri (1978); Origens de Juazeiro do Norte (1978); Presença Inconcursa de Norte-Rio-Grandenses na Colonização do Cariri (1979); Composições Poéticas de Hermes Carleial (1979); O Contingente Paraibano na Colonização do Cariri (1980); Autores Caririenses (1981); Lavras da Mangabeira – dos Primórdios a Vila (1981); Alencar Peixoto, Um Clássico (1981); Pernambuco nas Origens do Cariri (1981); Orações Acadêmicas (1983); O Talento Poético de Alencar e Outros Estudos (1984); São Vicente das Lavras (1984); Um Vernaculista e um Poeta (1985); Povoamento e Povoadores do Cariri Cearense (1985); Discursos Acadêmicos (1986); Lavras da Mangabeira (1986); Temas Históricos Regionais (1986); Ocorrências e Personagens (1987); Antônio Lobo de Macedo: o Homem e o Poeta (1988); Império do Bacamarte (1990); Ensaios e Perfis (2001); e Na Esfera das Letras (2010).

              Da bibliografia acima, dois livros tão-somente seriam suficientes para dignificar a reputação de Joaryvar Macedo como um dos nossos grandes historiadores. Trata-se de A Estirpe da Santa Teresa e de Império do Bacamarte, sem a necessidade de outros comentários, bastando mencionar que, com essa última obra, Joaryvar Macedo “estabeleceria um novo marco na historiografia política no nosso Estado, oferecendo aos cientistas dessa área e aos estudiosos dessa temática sociológica o mais completo ensaio do gênero até hoje escrito no Nordeste brasileiro”, ainda segundo F. S. Nascimento.

             Joaryvar Macedo consolidou sua formação cultural estabelecido numa região e tratando quase que exclusivamente da temática histórica do Cariri, o que não o impediu de ter “uma visão histórica do Brasil através da região em que viveu”, na opinião de Murilo Martins. 

             Transferindo-se para Fortaleza, em 1983, desempenhou, inicialmente, o cargo de Assessor do Presidente do Conselho de Educação do Ceará. Em seguida, seria Secretário de Cultura e Desporto do Ceará e Presidente do Conselho Estadual de Cultura, tendo sido eleito, em 1986, para a Academia Cearense de Letras, e, posteriormente, para o Instituto do Ceará.

              Professor da Universidade Regional do Cariri – URCA e chefe do seu Escritório em Fortaleza, Joaryvar Macedo foi ainda membro do Conselho Estadual de Educação. Foi, outrossim, um dos raros escritores cearenses a ser agraciado, pelo Governo do Estado, com a Medalha José de Alencar, honraria máxima a que um intelectual pode aspirar na Terra de Iracema.

               Sócio efetivo, correspondente ou honorário de várias instituições culturais, nacionais e internacionais, e detentor de vários tributos e comendas, Jorayvar Macedo faleceu em Fortaleza, aos 29 de janeiro de 1991, constituindo a sua morte uma das perdas de monta para a nossa cultura literária e historiográfica.

              Autoridade máxima, no Ceará, no campo da genealogia, Joaryvar Macedo pertenceu ao Instituto Genealógico Brasileiro, na condição de sócio titular, e, também nessa condição, integrou a Academia Cearense de Retórica e a Associação Brasileira de Bibliófilos, sendo patrono da Associação Cearense de Integração dos Terésios.

        Na sua terra de berço, o seu nome encontra-se estampado na maior distinção do município – a Medalha do Mérito Cultural Joaryvar Macedo – e na comenda de maior relevo da Academia Lavrense de Letras, na qual é patrono de uma de suas cadeiras.

       Em vida, foi Joaryvar Macedo a própria história do Cariri se movimentando, expressando-se em gestos e palavras, dimensionando-se nas páginas dos livros e opúsculos que nos legou e nos trabalhos esparsos respingados na imprensa caririense e na Revista do Instituto do Ceará, cujas páginas enriqueceu com a percuciência das suas observações.

                Sem nenhuma dúvida, foi Joaryvar Macedo uma das personalidades mais ilustres das letras cearenses e um dos mais eruditos historiadores do Ceará, cuja formação histórica pesquisou com a argúcia e o devotamento de um beneditino. 

                 Em todos os seus trabalhos de pesquisa Joaryvar Macedo primou por um estilo eloquente. E sempre que expendiu juízos em torno de fatos históricos, ele o fez com a melhor clareza de raciocínio. A sua linguagem literária revela-se, em todo o seu percurso, recheada de filamentos retóricos, demonstrando-nos o seu autor a sua condição de clássico, sendo ele um moderno.



Joaryvar Macedo

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

João Clímaco Bezerra: 2013 - 1913

          Dimas Macedo


1.  Primeiro Fragmento

  João Clímaco Bezerra nasceu em Lavras da Mangabeira, aos 30 de março de 1913. Filho de Raimundo Nonato Bezerra e de Maria da Costa Bezerra. As primeiras letras ele aprendeu-as na terra natal, e as tomou no velho Grupo Escolar, com as professoras Amélia Braga e Rosária Mota.

 Em Lavras, trabalhou no comércio local, transferindo-se depois para Fortaleza, onde estudou nos Colégios São João e Liceu do Ceará, do qual saiu para matricular-se na Faculdade de Direito da UFC, bacharelando-se em 1950.

  Pela Escola de Comércio Padre Champagnat, diplomou-se contador, ali iniciando a carreira de professor. Exerceu também o magistério no Instituto de Educação Justiniano de Serpa, na Faculdade de Filosofia, na Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas da Universidade Federal do Ceará, e na Escola de Administração do Ceará.

  Ocupou cargos importantes na vida pública do Ceará e do Brasil, tais os de diretor técnico de educação da Secretaria de Educação do Ceará, o de chefe de relações públicas do Banco do Nordeste e o de assessor técnico da Confederação Nacional da Indústria, no Rio de Janeiro, para onde se transferiu.

    Estreou, em 1948, com o romance Não Há Estrelas no Céu, bastante elogiado pela crítica e com ele incorporando-se aos escritores tidos como criadores do romance cearense, deixando nesse livro marcas indeléveis da infância. 

   Em 1952, apareceu o seu segundo romance – Sol Posto – que, assim como o primeiro, foi publicado pela Editora – José Olympio, do Rio de Janeiro. Também de 1952 é a novela Longa é a Noite, considerada, por Sânzio de Azevedo, uma ficção de corte machadiano e de urdidura quase enigmática.

  A terceira edição dessa novela, em formato de livro, foi publicada em 2007, pelas Edições Poetaria, sob minha responsabilidade. Orgulho-me, portanto, de ter concretizado esse grande projeto.

   No terreno da cônica e da curta ficção, é autor dos livros: O Homem e Seu Cachorro (Rio, Serviço de Documentação do MEC, 1959) e O Semeador de Ausências (Rio, Editora Record, 1967); e para a coleção nossos clássicos da Editora AGIR, João Clímaco Bezerra escreveu os ensaios sobre Juvenal Galeno (1959) e Humberto de Campos (1965).

  De 1980 é o romance – A Vinha dos Esquecidos. Mas um de livros de maior relevo, a longa ficção – Os Órfãos de Deus –, ainda permanece inédito, desafiando a expectativa de seus leitores e admiradores.

 Como jornalista, João Clímaco foi por longo tempo editorialista do jornal Unitário, de Fortaleza, órgão no qual manteve, diariamente, uma coluna de crônicas, praticando também a crítica literária e o ensaio com muito sucesso.

   Consagrado pela crítica nacional, João Clímaco Bezerra foi também ensaísta e novelista; integrou a Academia Cearense de Letras, onde ocupou a cadeira nº 9, que tem como patrono Fausto Barreto, e faleceu no Rio de Janeiro, aos 4 de fevereiro de 2006.

2. Segundo Fragmento

              João Clímaco Bezerra pertence à família dos nossos melhores romancistas, aqueles que utilizaram a camada ótica e a densidade psicológica de suas personagens para refletir sobre o tecido social que acoberta as suas intenções subjetivas.

             Autor de romances da maior expressão, tais os casos de Sol Posto (1952) e Não Há Estrelas no Céu (1948), esse escritor estaria situado, segundo o julgamento da crítica, numa linha intermediária entre Domingos Olímpio e Rachel de Queiroz.

               Para Artur Eduardo Benevides, teria sido João Clímaco “um mestre de alta qualificação”, reconhecendo também Benevides, no autor de A Vinha dos Esquecidos (1980), “um senhor absoluto da técnica de escrever e de romancear os fatos e o destino, por vezes trágico, dos seres, numa perspectiva de interpretar a dor de viver e o tempo perdido”.

             Aclamado, quando da sua estreia, como uma das revelações do romance brasileiro, por escritores como Jorge Amado, Graciliano Ramos, Érico Veríssimo e Tristão de Atayde, esse consolidador das intenções e das formas literárias mais puras do romance cearense, passaria à posterioridade como um dos escritores que, no Brasil, assumiam a literatura como vocação e destino.

            Quer nos romances acima nominados, quer nos livros de crônicas e nos ensaios que escreveu para a prestigiosa coleção Nossos Clássicos, da Editora Agir, acerca de Juvenal Galeno (1959) e de Humberto de Campos (1965), João Clímaco Bezerra sempre demonstrou, de forma consistente, que a literatura fora a sua grande miragem e a sua missão entre os vivos.

             Assim sendo, neste ano de 2013, no qual o autor de O Homem e Seu Cachorro (1959) completa o seu centenário, a impressão que ainda me causa a sua obra é a de que ela cada vez mais se impõe qual um projeto que resiste à corrosão do tempo, e aos ventos plurais, com que os leitores e a crítica literária a examinaram. 

             João Clímaco Bezerra é talvez o romancista cearense de maior alcance universal e de estilo literário mais espontâneo e apurado. A sua construção linguística lembra os referenciais e o legado de escritores como Adolfo Caminha e Oliveira Paiva, e de contistas tais Moreira Campos e Juarez Barroso.

              É denso e profundamente refinado o seu texto; é soberana a densidade psicológica das suas personagens, apesar da atmosfera de solidão e abandono que ronda a construção de A Vinha dos Esquecidos, um romance talvez tardio e desnecessário na bibliografia de João Clímaco.

            Leitor atencioso da obra desse grande escritor brasileiro, que me honrou com a sua amizade, tive o privilégio de ler os originais do seu romance de maior ambição: Os Órfãos de Deus, inexplicavelmente inédito até o momento, por preconceito de um círculo de amigos de João Clímaco, que nunca perdoaram as transgressões da personagem central do enredo, como se a voz interior do romancista viesse a interferir na sua afirmação sexual.

             Todo escritor heterossexual, como é o caso de João Clímaco, tem a liberdade artística de conduzir a construção de sua obra a partir dos seus recursos formais e polifônicos, da sua perspectiva de classe e de seus valores, e dele o que mais se espera é que seja realmente um transgressor das normas de vida do cotidiano. 

             A introversão homossexual do condutor da narrativa desse romance de João Clímaco remarca a conduta de uma personagem, ainda que se trate de um romance escrito a partir do enfoque da primeira pessoa.

             Romance de técnica recorrente e de enredo contado a miúde, a textura lírica de João Clímaco configura-se em Os Órfãos de Deus como discurso da melhor qualidade, apesar de autor utilizar, às vezes, uma linguagem tradicional que entra em choque com a dinâmica da narrativa.

           O sentimento obsessivo da culpa e do pecado ganha, nesse audacioso romance de João Clímaco, uma poeticidade e um vigor literário impressionantes, mas o destaque vai mesmo para a segurança da estrutura narrativa e para a visão do absurdo existencial, tão caro, aliás, à obra literária desse romancista.

              Mas, neste texto, o que quero destacar é um pequeno livro de João Clímaco Bezerra; um livro que sempre me tocou a sensibilidade de forma muito especial. Trata-se da novela Longa é a Noite, escrita em forma de diário e publicada, inicialmente, no nº 11 da revista Clã de dezembro de 1951, e que teve uma segunda edição tirada em parceria com uma novela de Stênio Lopes.

              Considerada por Sânzio de Azevedo como sendo um dos marcos da obra ficcional do autor, Longa é a Noite também pareceu a esse autor ser uma novela costurada de intenções e urdiduras quase enigmáticas. E, ainda segundo Sânzio de Azevedo, é nesse enigma “algo machadiano” que “reside uma das forças que constituem a grandeza dessa novela de João Clímaco Bezerra”.

             A decisão de republicar essa longa ficção de João Clímaco, tomada pelas Edições Poetaria, em 2007, constitui por certo um momento sublime da vida cultural do Ceará, colocando-se assim, em lugar de destaque, a densidade humana e a linguagem extremamente bela e criativa desse conhecido escritor brasileiro.

              Espero que o mistério e a urdidura semântica, que a trama subjetiva e a perspectiva existencial e ontológica dessa novela cearense – Longa é a Noite – continuem seduzindo o leitor, assim como o fizeram, aliás, quando ela foi publicada há mais de meio século.

               A releitura da obra de João Clímaco, neste ano do seu centenário, é um dos desafios que se colocam diante da crítica literária brasileira. Integrante de uma geração de romancistas, talvez a mais brilhante da nossa literatura, João Clímaco Bezerra precisa ser urgentemente reabilitado. O Ceará lhe deve esse tributo; o Brasil precisa ouvir a sua voz.




                                                 Imagem de Lavras da  Mangabeira (CE)
  Terra Natal de João Clímaco Bezerra