domingo, 30 de novembro de 2014

Estudo Lexical de O Rumor e a Conha de Dimas Macedo



                   Márcio Catunda

 
                        

                   Na utopia do romantismo erótico,
                   o poeta celebra o rumor e a concha.
                   O sopro da linguagem tempera a paisagem.
                   Ferido pelos punhais da lua,
                   quer flutuar em simetrias de luz,
                   nas ondas de um mar em chamas.
                   Quer expandir os sentidos no ato de viver,
                   até compreender as energias totais.
                   Cantor das tardes em lazuli
                   e da melodia dos lilases,
                   arde nos cromos da palavra que fascina.
                   Arauto dos delírios da circunstância sagrada.
                   Alumbrado de seduções líricas,
                   permanece ungido pelo senso da eternidade.
                   Cultor da pele constelada das sereias cálidas.
                   canta a festa depois dos vendavais da busca
                   e a lembrança feita escultura de música.
                   Perpetua a idade do sonho,
                   no Ícone femenino do luar.

Cantos de Amor e Morte

              Dimas Macedo






               Gabriel José da Costa, Bacharel em Filosofia, ex-comunista e ex-seminarista, é uma das figuras mais vivazes da cultura cearense, destacando-se como livreiro, mecenas e protetor de muitos que, no Ceará, lutaram pela Democracia, especialmente após a abertura política.

               A sua conhecida Livraria Gabriel, ainda em funcionamento, durante a década de 1980, tornou-se, em Fortaleza, uma espécie de abrigo de intelectuais, artistas, escritores e militantes políticos de esquerda.

              Na sua sede, na Rua Edgar Borges, no centro de cidade, a Livraria Gabriel congregou os vários segmentos da cultura cearense que experimentavam o seu estágio de transformação.

              Culto, douto e sempre muito inteligente, Gabriel sabia de tudo e sobre tudo dava conselhos em matéria de Literatura e Militância Política, e dizem que abria os bolsos para financiar os movimentos de rebeldia contra o senso comum.

              Em tudo o que fazia, Gabriel era apoiado pela sua mulher, Dona Maria das Neves, a Nevinha, esclarecendo-se aqui que, no passado, ele foi senhor de diversas companheiras, qual um perfeito Don Juan.

               Depois, esse velho militante político se internou na Faculdade de Direito da UFC e na Universidade de Fortaleza, em cujos Campi ainda mantém as suas livrarias, hoje bastante reduzidas, em face do avanço do capitalismo e das redes de distribuição e controle do mercado livreiro.

              O que poucos sabem é que Gabriel José da Costa é um exímio poeta, que traz na alma a marca de pernambucano desabusado e rebelde, tendo ele projetado no seu livro – 30 Poemas de Amor e Morte Para a Bem Amada os fundamentos da sua miragem literária.

               Esse doce livrinho de linguagem lírica e de estrutura polifônica bastante plural e escandida, chega, agora, à sua sétima edição, tirada pela Fundação Edson Queiroz, com projeto gráfico de Geraldo Jesuíno da Costa e apresentação de Batista de Lima.

              Recomendo a todos que leiam essa nova edição de 30 Cantos de Amor e Morte Para a Bem Amada, pois se trata de um livro da melhor extração, e de livro marcado pelo signo da poesia de alta qualidade.

            Seria impossível ao leitor não se apaixonar pela poesia de Gabriel e pela arte gráfica de Geraldo Jesuíno condensadas nesse conjunto de poemas. O sentimento amoroso e o apelo místico que ressaem das páginas desse livro emprestam a esse conjunto de poemas a elegância maior da sua sonoridade.

sábado, 29 de novembro de 2014

O Texto de Fernanda Quinderé



               Dimas Macedo


                                                     Beatriz Alcântara, Regina Fiúza e F. Quinderé




          Fernanda Quinderé possui um traço distintivo na sua postura literária: permite que a sua obra se faça a expressão de sua vida. E a sua criação, não raro, se resume a este postulado: a dignidade do intelectual e o ponto de vista do poeta se perfazem com a expansão do seu conhecimento, a concretização da sua segurança e a fragmentação do seu imaginário.

           A paixão criativa, em Fernanda Quinderé, me parece a coisa mais espontânea possível, no sentido de que a fanopeia e o palco se possam construir enquanto cenários da sua consciência.

          Transmuta-se Fernanda Quinderé em jornalista e atriz, criando-se aí o entorno das suas diversas personas, pintadas em retratos líquidos e plurais, que apontam para o movimento e a viagem, mas é a escritura literária e a leveza do texto aquilo que garante a sobrevida da sua produção.

           Fernanda é dona de um alfabeto literário próprio e de um estilo pessoal e particularíssimo. E é justamente disto que um artista de talento precisa: ser desigual em relação a seus contemporâneos; ser original no processo de montagem do seu objeto criativo.

           O drama e o tecido com os quais se mostra a boca de cena de um romance seriam, para mim, pontos de partida da sua produção. Falei sobre isto quando li os livros de Fernanda Quinderé – Calabouço Para os Reis (2005) e Papos de Mulher (2001) ou quando entendi que os poemas de Mulher Azul (2002) podiam ser vistos como alegorias da sua personalidade.

           Diferente não é o meu juízo a respeito do seu livro de memórias – Bodas da Solidão (Fortaleza: Livro Técnico, 2007), romance que nos conta uma possível solidão a dois, vivida pela autora em sua relação com Luizinho Eça, o gênio máximo do piano e da partitura musicalizada.

            Nesse livro de Fernanda Quinderé o que se reinventa é um mito e o que se conta é uma escritura literária de boa qualidade. As personagens e o tecido da trama, podem, inesperadamente, parecer ficção, mas não é este o melhor enquadramento do texto, pois firmam-se também nas suas entrelinhas, o prazer que podemos retirar dos seus códigos semânticos.

            A plenitude do ato criativo, a epifania do texto, a dramaturgia e a memória e, acima de tudo, o ritual do corpo e da entrega dão a esse livro de Fernanda Quinderé um estatuto de monta entre os criadores da arte dramática do Brasil.

            Não é, no entanto, de arte dramática que cuida a autora de Mulher Azul. A sua narrativa é límpida quando se trata de perquirir o drama que se esconde no subtexto do livro, porque aí Fernanda Quinderé conquista a sua partitura de poeta, de musa e de atriz.

             Trata-se, pois, do livro em que Fernanda melhor se espelha diante da arte de criar, superando os seus desafios estéticos, a sua necessidade de formas, as suas armadilhas verbais, mas o que reescrevo, de público, é que vejo os sentidos do seu texto como se fossem bodas de paixão, bodas que se tecem com os fios da memória e com os linhos da melhor linguagem literária.
in Bodas da Solidão.
Fortaleza: Livro Técnico, 2007.

sábado, 22 de novembro de 2014

O Advogado de Cristo


               Dimas Macedo


               Augusto Neto foi meu aluno no Curso de Especialização em Direito Ambiental da Escola Superior do Ministério Público/Universidade Estadual do Ceará. A sua personalidade e a sua postura forte e decidida, a convicção dos seus argumentos e a elegância da sua maneira de expor os seus pontos de vista e de saber se render às minhas explicações de ordem filosófica ou doutrinária evidenciaram, de logo, o inteligente profissional do direito que se escondia por trás da sua discreta maneira de agir.

             A empatia que se estabeleceu entre nós se estendeu para além da sala de aula. E nos intervalos entre um e outro módulo que eu ia ministrando, as nossas conversas foram se amiudando, e eu fui sentindo com o tempo que podia ganhar uma amizade desinteressada.

             Ao final do Curso, Augusto foi se revelando ainda mais atencioso, e me surpreendeu de forma positiva quando presenteou-me com a 2ª edição do seu livro – O Advogado de Cristo –, pedindo-me que eu o lesse e escrevesse um prefácio para a 4ª edição (Fortaleza: Impece, 2007).

             Apesar de já ter declarado (de fato e por escrito) que não mais escreveria qualquer forma de apresentação de livro de outros escritores, face à complexidade e à extensão da minha obra literária, que estão a exigir maiores cuidados e dedicação diuturnos, rendi-me à elegância do seu convite e resolvi lhe prestar as minhas homenagens.

              Li o seu livro e a sua peça de defesa do maior de todos os seres que a humanidade até o momento conheceu. E li-os com o maior prazer e com a curiosidade sempre aguçada para as linhas mestras do seu raciocínio. Vi, na nota de abertura do livro, que Augusto Neto já subiu trinta e seis vezes ao Tribunal do Júri e que já amealhou pelos menos trinta absolvições daqueles que inteligentemente lhe confiaram as suas causas.

              Tratando-se, no caso do autor desse livro, de um homem de fé e de convicções éticas e morais inabaláveis, me parece coerente afirmar que Deus – o Cristo, o Filho do Homem, o Profeta Maior da Esperança, da Justiça e da Fraternidade – o escolheu para a sua defesa diante do Tribunal do Júri.

              Valendo-se dos recursos, das normas, da doutrina e de outros elementos substanciais e processuais do Direito Moderno, o autor promove a Defesa de Jesus, não nos deixando dúvida de que o Tribunal da Ética Cristã e Humana dos seus leitores e admiradores aceitou a sua brilhante peça de Defesa.

              Augusto Neto não constitui tão-somente uma promessa no campo específico do Direito: é uma revelação e uma reserva moral que já se tornaram indispensáveis. Acredito no seu indiscutível talento de advogado e de jurista e recomendo aos leitores um voto de confiança no seu futuro promissor.

sábado, 8 de novembro de 2014

Sociologia dos Trópicos

            Dimas Macedo

 
                                                   Foto: Lúcia Cidrão  



 O fervor literário de Iracema Régis parece mesmo que não para. De tempos em tempos, eis que essa inquieta escritora abre suas gavetas, polindo os cristais do seu imaginário e transformando em livros aquilo que lhe foi ditado pelas suas pesquisas ou pelos alforjes da sua oficina criativa.

 Cearense de Limoeiro do Norte, encontrou em São Paulo o destino da sua visão de andarilha, dali agitando o cenário cultural, não apenas do ABC paulista, mas também e especialmente de Mauá, com ressonância em vários Estados do Brasil.

 Integrante do Colégio Brasileiro de Poetas, ali fez-se figura de relevo. Abraçou a poesia popular e destacou-se como cordelista, mas nunca perdeu a sua condição de poetisa de linguagem erudita e de ensaísta e crítica literária que se reinventa, desde o início da sua produção.

 É autora de mais de uma dezena de folhetos de cordel e, entre os seus livros de poemas, eu destaco: Argamassa (2005) e A Palavra Exata (2012), sendo de 2006 o seu livro Babilônia de Babel, no qual ela se revelou conhecedora do texto literário e analista vivaz da sua estrutura semântica. 
          
Agora Iracema Regis volta ao ensaio literário e me escolhe como prefaciador do seu livro Sociologia dos Trópicos (São Paulo: Giostri, 2016), reatando os Fios de Ariadne com que tecemos a nossa convivência e com que nos irmanamos na seara do intercâmbio de ideias.

Em A Sociologia dos Trópicos pulsa o estro da sua visão de ensaísta, nos domínios da crítica, da cultura popular e do memorialismo, estudando a obra ou a personalidade de expoentes da nossa Literatura e da nossa Sociedade.

  Nesse conjunto de artigos de Iracema Régis não faltou o seu olhar sobre a Música, a Política, a Cidadania, a Sociologia e o Imaginário, mostrando-nos a autora a sua formação polimorfa, a sua cultura humanística e o seu amor pela militância literária.

A sua produção cultural não paga tributo à cultura acadêmica. É despojada e talvez tributária da cultura que apenas almeja a audiência franca ou a força emotiva da compreensão e da cumplicidade. E nisso se resume a sua percepção criativa, a sua interação com os leitores e a afirmação da sua experiência no campo literário.


 Iracema Régis é escritora que se firma no contexto da sua geração, honrado a cultura brasileira a partir das suas raízes fincadas no nosso Ceará, Província Universal da Luz, Terra do Sol e dos Ventos e da Resistência Cultural.