sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Punhalzinho Cravado de Ódio


                     Dimas Macedo


        O livro Punhalzinho Cravado de Ódio (Fortaleza, Secretária de Cultura e Desporto, 1986) –, de Nilto Maciel, compreende um conjunto de contos de diferentes épocas, mas que ainda hoje (1996), passados dez anos, continuam plenamente atuais. São contos, assegura o autor, “das mais variadas correntes: rurais, alegóricos, psicológicos, de atmosfera, de costumes e sócio-documentais”.

        Contudo, a advertência acima serve tão-somente para antecipar que Punhalzinho Cravado de Ódio é um livro sem unidade temática, o que, aliás, não resulta em desproveito da apreciável qualidade dos textos que exibe. Pelo contrário, prova a versatilidade de Nilto Maciel em trabalhar assuntos aparentemente tão díspares, mas que no fundo convergem para a unificação de uma temática que se vem cristalizando como pano de fundo na sua atividade ficcional, que é a capacidade de fundir a carnavalização do picaresco com a atmosfera do alegórico. Dentro desses parâmetros é que se enquadra, no meu entender, a maioria dos trabalhos de ficção de Nilto Maciel.

        Mas é claro também que esta não é a única perspectiva de assimilação de sua escritura literária, da mesma forma que a classificação por ele mesmo proposta não esgota o enquadramento dos universos ficcionais abordados. O conto intitulado “Insensatez”, por exemplo, podia muito bem ser classificado como um conto de configuração urbana, assim como existem aqueles que o autor reconhece como de procedência rural.

        Esta variedade de temas e, principalmente, de técnicas narrativas, pelo que se pode depreender de uma paciente leitura do conjunto dos contos reunidos, emerge da inconformação do autor de não mais aceitar as seduções da estética literária tradicional, bem como da consciência de que é preciso reinventar a carpintaria da ficção, sob pena do processo de criação converte-se em técnica de reportagem. 

        Em Punhalzinho Cravado de Ódio existem contos de excelente concepção, como é o caso de “A Arca”, “O Desafio de Facundo”, “O Fogo e a Luz”, “Quimera”, “Rede de Cobras” e “Teoria da Desafiadura”, isto sem falar na estória que dá título ao volume, bem como no interessantíssimo “Tadeu e a Mariposa”, este último um conto de permanente interesse para o leitor, quer pela originalidade do enredo que ostenta quer pela aura de criatividade que o reveste.

          Trata-se, em verdade, de um livro que ao leitor reserva agradáveis surpresas. A rigor, não existe uma ordem de leitura que realmente corresponda à sequência dos contos. No entanto, tenho para mim que a melhor opção de leitura seria aquela que começasse pelo último texto do livro. Assim, o leitor seria mais facilmente arrastado por todo percurso do volume e, de início, evitaria a difícil travessia que começa com a descoberta de “A Lenda de um Reizinho – Capítulo Exótico” e termina com o último parágrafo do conto “Esses Abraçadores da Morte”.

        No entanto, apesar dessa recomendação, é preciso igualmente que se mencione que a estória que abre o volume é uma página de refinada sensibilidade, assim como belíssimo é o conto intitulado “A Desilusão de Jonathan Swift”, o segundo que ali aparece.

       Por fim, registre-se que em Punhalzinho Cravado de Ódio Nilto Maciel reencontra-se com o melhor da sua produção, quer pela comprovação de que é realmente mestre na arte de contar estórias inesperadamente fabulosas, quer pela sua obstinação de permanecer fiel a uma temática e uma técnica literária particularíssimas. No mais, diga-se do proveito que pode auferir o leitor com a assimilação da sua atmosfera criativa, bem assim com o conhecimento da sua aventura picaresca e do seu discurso alegórico e participativo. 

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