Dimas Macedo
1) Dotar o 1º grau de recursos (humanos
e orçamentários) condizentes com a elevada demanda processual nessa instância
pode ser encarada como medida indispensável para evitar o colapso da prestação
da justiça cearense e brasileira? Considerando que 90% do total de processos em
tramitação no Brasil (95,14 milhões, em 2013) encontram-se no 1º grau e que o
país poderá registrar 114,5 milhões de processos em 2020 (dados do CNJ).
Dimas Macedo – Entendo
que estou diante de uma pergunta e de um esclarecimento apresentado depois
dessa indagação. Quanto à pergunta formulada, acho que os integrantes do Poder
Judiciário de primeiro e segundo grau deveriam se dedicar de forma mais efetiva
ao desempenho da sua finalidade, assimilando a consciência de que são
servidores do Estado e que já auferem rendimentos satisfatórios e, em alguns
casos, rendimentos privilegiados; que lhe cabe um múnus público especial, senso
de responsabilidade e um compromisso para com a dignidade do papel que exercem
na Sociedade, em nome do interesse público. O Judiciário brasileiro não
entraria nunca em colapso se todos os seus órgãos efetivamente dispusessem o tempo
de trabalho de que dispõem para se dedicar aos seus afazeres, afastando-se do
seu elitismo, do seu senso de superioridade.
Quanto ao percentual de processos no
primeiro grau, isso decorre de uma lógica inerente ao duplo Grau de Jurisdição
e do fato de que o segundo grau funciona como um filtro. A questão do
quantitativo de processos distribuídos aos órgãos de primeiro grau e a sua
relação com a demanda daqueles que precisam desses serviços, no Brasil, precisa
ser enfrentada com seriedade. Na indagação que me é formulada, vê-se, logo no
seu anunciado, que não ficou claro para os leitores quantos juízes de primeiro
grau existem no Brasil para dar conta dessa demanda, nem qual o contingente da população
estaria sendo atendido. Os órgãos de primeiro grau já entram na discussão
assumindo o papel de vítimas.
A autonomia orçamentaria do
Poder Judiciário é bastante clara e está garantida pela Constituição. Se não
fossem os desperdícios, os gastos supérfluos, os benefícios e auxílios, muitas
vezes ilegais e inconstitucionais, pagos a muitos nichos da Magistratura, como
vem denunciando a mídia nacional, acho que o orçamento que temos atualmente
seria mais do que suficiente.
2) Deficiências estruturais na 1ª instância refletem a sobrecarga de
trabalho e crescente elevação do adoecimento de juízes. Tendo em a relevância
social do papel do juiz, qual é a importância de garantir condições de trabalho
adequadas e a preservação da saúde física e mental dos profissionais da
categoria vista?
Dimas
– As deficiências estruturais de qualquer organização, como ensinam os manuais
de gestão pública ou privada, são respondidas sempre com criatividade, divisão
racional do trabalho, espírito de equipe e liderança. E aqui deixo formulada
esta pergunta: por que alguns juízes cumprem integralmente a sua pauta e outros
apenas se queixam? Um dos fatores mais destacados pela Medicina e a
Psicanálise, acerca do fato dos problemas de saúde da parte dos empregados ou
servidores, está relacionada com a inaptidão para a forma de trabalho que
executam. A maioria dos livros sobre gestão, tem mostrado que aqueles que se
dedicam ao trabalho por vocação e convicção são pessoas felizes.
A
importância de garantir condições de trabalho adequadas e a preservação da
saúde física e mental dos profissionais da categoria, no caso, é relevante para
a conquista da qualidade do trabalho dos magistrados. A saúde física e mental
dos magistrados, contudo, não é um contingenciamento apenas dessa modalidade de
prestação de serviços à comunidade. Ela faz parte da vida funcional de todos os
trabalhadores do setor público e privado.
3) Caso persistisse
a inexistência de iniciativas visando melhorias para o 1º grau, de que modo
poderia ser afetada a população que busca o judiciário?
Dimas – Não seria tão afetada se os órgãos do Poder Judiciário
de primeiro grau assumissem o senso de responsabilidade para com a condição
daqueles que deles dependem.
4) O investimento em processos conciliatórios extrajudiciais, no
caminho da desjudicialização da justiça, pode agregar que ganhos à prestação
jurisdicional?
Dimas – Claro. E para
isso nós já temos no Brasil muitos nichos legais e constitucionais que estão
dando excelentes repostas, agindo com mais desenvoltura e aptidão para o
trabalho do que muitos magistrados, talvez pelo fato de que estão trabalhando
de forma simples e desburocratizada. Desgraçadamente, a burocratização do
Judiciário, no Brasil, tem sido uma forma recorrente que a maioria dos
magistrados pratica para não enfrentar os percalços e desafios inerentes à sua
atividade funcional. Criar e alimentar a burocracia tem sido uma forma de fugir
da responsabilidade de decidir. No mais, registro que a burocratização tem sido
uma marca do Poder Judiciário e não de outros Poderes do Estado. Por que do Judiciário?
Eis um desafio para esse poder estatal: livrar-se desse estigma que tanto
macula a sua imagem.
5) Dados de pesquisa recente da Fundação Getúlio Vargas mostram que 32%
dos brasileiros confiam no Poder Judiciário e 81% concordam com a afirmação de
que é fácil desobedecer as leis. De que modo as deficiências estruturais do
judiciário, que levam à morosidade da justiça, contribuem para esses
indicadores?
Dimas – Sou jurista,
Procurador do Estado e Professor de Direito, mas me coloco entre os 81 por
cento que concordam com a afirmação de que é fácil desobedecer as leis,
especialmente quando temos muitos integrantes do Poder Judiciário levando às
últimas consequências essa forma de energia negativa.
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