Não cabe ao historiador imaginar
o fato ou caracterizar o contexto histórico sobre o qual se debruça, utilizando
apenas a imaginação. A verificação apodítica e o estabelecimento da verdade
histórica são os seus instrumentos de trabalho. E não existe liberdade para
criação no campo da historiografia.
Os
historiadores não imaginam os fatos; mas quando são, igualmente, criadores, aí,
sim, lhes é permitido imaginar a sua obra literária. Coisa rara, na história,
tem sido a existência de historiadores que foram também criadores. Joaryvar
Macedo é um deles. Não à toa, esse grande escritor cearense figura em três
antologias que tratam da nossa poesia.
No meu livro Lavras da
Mangabeira – Roteiros e Evocações (Fortaleza: Secult, 1986) recolhi
três poemas de Joaryvar Macedo, todos, a meu juízo, de excelente feitura. Os
textos foram extraídos do seu livro de estreia Caderno de Loucuras (Crato:
Empresa Gráfica Ltda, 1965), cujo cinquentenário acorreu em 2015.
Caderno de Loucuras não teve a sorte
dos demais livros de Joaryvar, em face de uma circunstância, tão somente: o
autor foi impiedoso em localizar e destruir os exemplares que pertenceram a
pessoas de sua família, não restando, sequer, os volumes guardados por sua
mulher e pelas suas irmãs.
Também
não consegui encontrar aquele que ele destinou ao meu pai, seu irmão e
padrinho, a despeito de meu pai possuir todos os primeiros livros do meu tio
Joaryvar. Alguma coisa, neste livro, o teria deixado insatisfeito. Mas o que o
teria incomodado, de verdade, seria o fato de que o livro representou para ele
uma estreia imatura.
Seria
isso mesmo? Eis um enigma que dificilmente será revelado. Quando lhe solicitei
consultar esse livrinho, por volta de 1985, almejando copiar os seus poemas
referentes ao cancioneiro de Lavras, ele se antecipou e me remeteu os seus
poemas que versam sobre essa temática, fazendo o mesmo com o escritor Raimundo
Araújo, autor do livro Poetas do Ceará (Fortaleza: Ed.
Henriqueta Galeno, 1983).
Curiosamente,
Joaryvar Macedo nunca eliminou este livrinho da sua bibliografia. Fiz um
rastreamento em todas as listas de seus livros por ele divulgadas, e em todas,
o Caderno de Loucuras aparece. O livro nunca foi rejeitado
pelo seu autor, mas o seu conteúdo, sim, e nisso reside uma curiosidade que
chama a atenção.
Murilo
Martins, que sucedeu Joaryvar Macedo na Academia Cearense de Letras, e que foi
seu médico particular no período que antecedeu à sua morte, nunca conseguiu pôr
os olhos neste livrinho e, quando preparava o seu livro Poetas da
Academia Cearense de Letras (Fortaleza: Expressão Gráfica, 2014),
chegou a duvidar da sua existência.
Contudo,
eu nunca perdi a esperança de pôr as mãos nesse indigitado caderno de poemas.
Em 2013, acreditei que teria um exemplar do livro, não apenas para consulta,
mas para a minha propriedade. Foi o que me prometeu Renato Casimiro, um dos
grandes amigos de Joaryvar Macedo, mas o volume do Renato, não foi localizado,
e não existe nada a respeito desse livro catalogado em bibliotecas do
Ceará.
Em
2014, banhei-me de um susto, quando, depois de várias décadas, reencontrei-me
com o bibliófilo e intelectual, nascido em Lavras da Mangabeira, Anchieta
Mont’alverne, que invocou o nome de Joaryvar Macedo, dizendo que possuía um
exemplar do seu livro de estreia.
No
início, não acreditei, mas em pouco tempo (por meio de um portador de
confiança), Anchieta fez o volume vir de Juazeiro do Norte até Fortaleza, para
o meu regalo. Pedi para fazer uma cópia, no que fui atendido. Confiei a
operação a Geraldo Jesuíno e o resultado de tudo é esta segunda edição, tirada
pelas Edições Poetaria, em 2015.
O
exemplar que serviu de base a esta tiragem do Caderno,
curiosamente, traz o autógrafo do Dr. Aloysio Férrer, ex-Prefeito de Lavras da
Mangabeira, a quem o livro foi dedicado. No entanto, nenhum dos possíveis
volumes que teriam ficado com o Dr. Aloysio, foi localizado entre os seus
papéis.
Mais um enigma a ser desvendado,
pensei. E digo que ganhará um prêmio quem vier a encontrar o volume pertencente
ao próprio Joaryvar.
Caderno
de Loucuras, 2ª ed.
Fortaleza: Edições Poetaria, 2015
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