segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

A Letra e o Discurso de Dimas Macedo (DN)

            Diário do Nordeste – 19/08/2014       


             A arte do pensamento por imagens, os assomos da intuição, a busca de um sistema de objetos indissociados, os domínios expressionais de afinidades, o movimento e a oscilação da escrita, entre a ficção e a reflexão. É a partir dessa síntese conceitual apertada e, ao mesmo tempo, profunda, que o escritor cearense Dimas Macedo procura definir os textos ensaísticos que permeiam a nova edição do seu livro A Letra e o Discurso: ensaios e perfis literários (Fortaleza: Editora UFC, 2014).
          "O ensaio é tudo o que importa e é tudo que empresta sentido e unidade aos acertos da minha produção", define. E, dentro dessa perspectiva, reúne nesta edição um conjunto de prefácios, resenhas e perfis, escritos entre 2003 e 2013 e que se enquadram perfeitamente na proposta desse gênero literário.
             A bagagem de 25 livros publicados, dentre os quais oito de poesia, sete de crítica e dez de ensaios, conferem ao autor a experiência necessária para apostar em textos aparentemente díspares ou desconectados, porém sintonizados com a estética do desejo e da recepção, tal como ele mesmo apresenta.
             É bebendo da fonte de Sainte-Beuve, Hume, Emerson, Montaigne, Barthes, Cioran, Octavio Paz e Albert Camus (no plano do sistema literário), e Gustav Jung (no campo da escritura do inconsciente), que Dimas desvela a cultura do ensaio a qual vincula boa parte de sua obra.
             Ciente de que enfrenta um objeto cultural maior do que ele, visto que o conhecimento sobre o mundo e a realidade é sempre opaco e superficial, o ensaísta aproveita da liberdade de criação autoral proposta pelo gênero e coloca-se entre a ficção e a investigação de ordem filosófica como forma de se autoapresentar. E consegue.
             Ao folhear os textos presentes em A Letra e o Discurso, o leitor poderá dialogar não só com os autores sobre os quais Dimas tece suas críticas, como também debruçar-se na produção de conhecimento do próprio crítico.
             Faz-se, portanto, um mergulho em direção ao testemunho pessoal e à reflexão obsessiva de um escritor em constante ebulição e disposto a construir com leveza, e munido de uma objetividade subjetiva, os caminhos que levam à produção do saber.
            Nesse sentido, ele busca em seu livro, estabelecer a ponte entre esse conhecimento e a comunicação com o futuro, desprendendo-se do sistema de ideias no qual se encontram inseridos seus objetos de reflexão.

              Seleção

              Em 173 páginas e trinta textos, Dimas Macedo apresenta uma infinidade de obras teóricas e literárias reunidas a partir de uma conversa estabelecida entre leituras diversas. As referências a autores nacionais e internacionais, bem como a valorização dos expoentes locais se fazem presentes em grande escala nos ensaios produzidos por ele.
              O texto de abertura, por exemplo, condensa a visão do autor sobre a obra do contista Samuel Rawet a partir da análise feita por Vládia Mourão em seu livro – Escritura do tempo no conto de Samuel Rawet (Fortaleza: Edições Poetaria, 2007). Assim como nos ensaios subsequentes a este, Dimas, não só faz referência à vida e ao trabalho do escritor estudado, como também, busca explicitar o caminho percorrido por quem dedica sua pesquisa a ele.
              Com esta intenção, ele vai traçando perfis literários diversos, não se abstendo de apresentar, por entre as análises, um pouco do que ele mesmo representa como poeta, crítico e historiador.

            Enciclopédia

             Assim, com textos profundos, ainda que leves e curtos, o leitor ganha, aos poucos, uma série de referências e indicações de leitura, fazendo do livro de Dimas uma enciclopédia flutuante.
            Flutua-se, diga-se de passagem, pelos mais diversos gêneros. Conto, crônica, prosa, poesia. Tudo tem vez na análise crítica do escritor, que faz do próprio trabalho um instrumento de divulgação de outros tantos estreantes na cena nacional.
            Giselda Medeiros, João Clímaco Bezerra, Aíla Sampaio, Ronaldo Brito, Sânzio de Azevedo, Patativa do Assaré, Chico Buarque, Mano Alencar e Pablo Neruda são apenas alguns dos nomes contemplados no livro.
             Direta ou indiretamente, seja por meio de livros escritos por eles ou de análises das suas obras, cada um deixa a contribuição no todo costurado com sensibilidade por Dimas. Entre os movimentos e as oscilações da escrita, o autor firma, portanto, um pensamento coletivo e, acima de tudo, transformador.

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