A arte do pensamento por imagens,
os assomos da intuição, a busca de um sistema de objetos indissociados, os
domínios expressionais de afinidades, o movimento e a oscilação da escrita,
entre a ficção e a reflexão. É a partir dessa síntese conceitual apertada e, ao
mesmo tempo, profunda, que o escritor cearense Dimas Macedo procura definir os
textos ensaísticos que permeiam a nova edição do seu livro A Letra e o Discurso: ensaios e perfis literários (Fortaleza:
Editora UFC, 2014).
"O ensaio é tudo o que importa e
é tudo que empresta sentido e unidade aos acertos da minha produção",
define. E, dentro dessa perspectiva, reúne nesta edição um conjunto de
prefácios, resenhas e perfis, escritos entre 2003 e 2013 e que se enquadram
perfeitamente na proposta desse gênero literário.
A bagagem de 25 livros publicados,
dentre os quais oito de poesia, sete de crítica e dez de ensaios, conferem ao
autor a experiência necessária para apostar em textos aparentemente díspares ou
desconectados, porém sintonizados com a estética do desejo e da recepção, tal
como ele mesmo apresenta.
É bebendo da fonte de
Sainte-Beuve, Hume, Emerson, Montaigne, Barthes, Cioran, Octavio Paz e Albert
Camus (no plano do sistema literário), e Gustav Jung (no campo da escritura do
inconsciente), que Dimas desvela a cultura do ensaio a qual vincula boa parte
de sua obra.
Ciente de que enfrenta um objeto
cultural maior do que ele, visto que o conhecimento sobre o mundo e a realidade
é sempre opaco e superficial, o ensaísta aproveita da liberdade de criação
autoral proposta pelo gênero e coloca-se entre a ficção e a investigação de
ordem filosófica como forma de se autoapresentar. E consegue.
Ao folhear os textos presentes em A Letra e o Discurso, o leitor poderá
dialogar não só com os autores sobre os quais Dimas tece suas críticas, como
também debruçar-se na produção de conhecimento do próprio crítico.
Faz-se, portanto, um mergulho em
direção ao testemunho pessoal e à reflexão obsessiva de um escritor em
constante ebulição e disposto a construir com leveza, e munido de uma
objetividade subjetiva, os caminhos que levam à produção do saber.
Nesse sentido, ele busca em seu
livro, estabelecer a ponte entre esse conhecimento e a comunicação com o
futuro, desprendendo-se do sistema de ideias no qual se encontram inseridos
seus objetos de reflexão.
Seleção
Em 173 páginas e trinta textos, Dimas Macedo apresenta uma infinidade de
obras teóricas e literárias reunidas a partir de uma conversa estabelecida
entre leituras diversas. As referências a autores nacionais e internacionais,
bem como a valorização dos expoentes locais se fazem presentes em grande escala
nos ensaios produzidos por ele.
O texto de abertura, por exemplo,
condensa a visão do autor sobre a obra do contista Samuel Rawet a partir da
análise feita por Vládia Mourão em seu livro
– Escritura do tempo no conto de Samuel Rawet (Fortaleza: Edições Poetaria,
2007). Assim como nos ensaios subsequentes a este, Dimas, não só faz referência
à vida e ao trabalho do escritor estudado, como também, busca explicitar o
caminho percorrido por quem dedica sua pesquisa a ele.
Com esta intenção, ele vai
traçando perfis literários diversos, não se abstendo de apresentar, por entre
as análises, um pouco do que ele mesmo representa como poeta, crítico e
historiador.
Enciclopédia
Assim, com textos profundos, ainda
que leves e curtos, o leitor ganha, aos poucos, uma série de referências e
indicações de leitura, fazendo do livro de Dimas uma enciclopédia flutuante.
Flutua-se, diga-se de passagem,
pelos mais diversos gêneros. Conto, crônica, prosa, poesia. Tudo tem vez na
análise crítica do escritor, que faz do próprio trabalho um instrumento de
divulgação de outros tantos estreantes na cena nacional.
Giselda Medeiros, João Clímaco Bezerra,
Aíla Sampaio, Ronaldo Brito, Sânzio de Azevedo, Patativa do Assaré, Chico
Buarque, Mano Alencar e Pablo Neruda são apenas alguns dos nomes contemplados
no livro.
Direta ou indiretamente, seja por
meio de livros escritos por eles ou de análises das suas obras, cada um deixa a
contribuição no todo costurado com sensibilidade por Dimas. Entre os movimentos
e as oscilações da escrita, o autor firma, portanto, um pensamento coletivo e,
acima de tudo, transformador.
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