Com alegria, agradeço a Medalha Boticário Ferreira, perguntando, a mim mesmo, se sou merecedor da homenagem. Quarenta anos de magistério, perfeitos em 2017, talvez justifiquem a sua concessão ao escritor e ao jurista, mas, assim como Drummond, o Poeta de Itabira, tenho apenas duas mãos e o sentimento do mundo.
Como cristão pauliano, atravesso estes tempos extremos que estamos
vivendo como se fosse a ostra em seu enfrentamento com o vento, como se fosse o
rumor que, às vezes, se funde com a concha e com ela se recolhe no sopro
sublime da paixão.
Sei que a vida é uma Graça, e que, a cada dia, eu a desfruto com a
beleza que Deus nos confiou, e com os dons e os talentos que ele conferiu à
minha inquietude: branda, como as águas serenas de um rio, mas incompreendida,
às vezes, por aqueles que não aceitam a minha liberdade.
O título que recebo é o tributo com o qual se reconhece a dignidade de
fazer literatura e de fazer a profissão de fé na palavra ritmada e na palavra
fundadora do belo. A honraria, contudo, não cabe no meu contentamento.
Pulveriza-se, antes, pelos espaços urbanos da cidade, desliza pelas suas
casas de pasto e pelos seus polos de prazer e convivência, por onde espicho os
meus olhos de ver e de sentir, porque de Fortaleza eu sei as suas ruas e o seu
jeito gostoso de deitar.
Sei que existem várias Fortalezas a quem agradecer: a Fortaleza que
sofre com a violência e com sua falta de memória; a Fortaleza que dormita na
Praia de Iracema; a Fortaleza que chora as suas contradições, mas que se
reinventa pela boemia que pratiquei no Estoril e no Clube do Bode, na Confraria
dos Puros e na Sociedade dos Poetas Vivos.
Sim, porque não podemos mensurar em
Fortaleza, praias, ruas ou espaços coletivos que eu não tenha palmilhado,
vinhos e sabores que eu não haja consumido, línguas ou idiomas da sua arquitetura
que eu não tenha degustado com a minha linguagem de poeta.
Ao Vereador Portinho, agradeço aquilo que ele fez pela poesia, nomeando
a mim como o representante dos poetas e intelectuais de Fortaleza que esta
Câmara de Vereadores achou por bem distinguir, porque aqui, de primeiro, se
premia o escritor e se valoriza o cidadão, colocando-se a Literatura no centro
do debate político.
As tatuagens o céu e o sal de Fortaleza
foram modelando em meu corpo, ouvem, com desvelo, os sinos inquietos do meu
coração, pois é com a alma dos que amam a liberdade e as formas de viver em
plenitude que aqui compareço para agradecer a maior homenagem desta Edilidade.
Assim, declaro de público e de
tribuna, que honrarei com vinhos e estrelas a medalha com que fui distinguido,
o título com que fui agraciado, o qual ficará gravado na alma, com o fogo do
incenso e da cidadania.
O Boticário Ferreira, numa época que
se perde no tempo, dirigiu o destino desta urbe, e o poço por ele perfurado, no
logradouro que hoje leva o seu nome, tornou-se o coração da cidade. Como
vereador e presidente da Câmara, governou a Fortaleza Velha com os olhos
fincados no futuro e com a retidão que fez do seu nome uma legenda.
Curvo-me ao exemplo do Boticário Ferreira, olho para o passado de onde
vim, saúdo os amigos que nesta cidade conquistei, pondo aqui em destaque, a
minha família e, de uma forma especial, os meus filhos e a minha mulher.
Não cheguei aqui de supetão, mas juro que
cheguei, trazendo na alma uma canção, que quero partilhar com o vento e com o
edifício da Fé que se ergue, de forma soberana, no meu coração.
Entre os que estão no Plenário, ponho em evidência o Professor João
Arruda, que muito conspirou para que eu pudesse chegar até aqui, e destaco o
nome de Marta Filgueiras, que veio de São Luiz para estar comigo nesta noite,
ao lado de Lúcia Cidrão, de Pablo e de Diego, de Lúcia Macedo Maciel e de
Sandra Maria de Macedo.
Por último, não posso deixar de registrar: “um rio corre na alma e a
minha calma talvez não denuncie aquilo que ocorre, aquilo que não morre e que
se faz alento em minha vida”.
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