Dimas Macedo
O livro
– Punhalzinho Cravado de Ódio (Fortaleza,
Secretária de Cultura e Desporto, 1986) –, de Nilto Maciel, compreende um
conjunto de contos de diferentes épocas, mas
que ainda hoje (1996), passados dez anos, continuam plenamente atuais.
São contos, assegura o autor, “das mais variadas correntes: rurais, alegóricos,
psicológicos, de atmosfera, de costumes e sócio-documentais”.
Contudo, a advertência acima serve
tão-somente para antecipar que Punhalzinho
Cravado de Ódio é um livro sem unidade temática, o que, aliás, não resulta
em desproveito da apreciável qualidade dos textos que exibe. Pelo contrário,
prova a versatilidade de Nilto Maciel em
trabalhar assuntos aparentemente tão díspares, mas que no fundo convergem para
a unificação de uma temática que se vem cristalizando como pano de fundo na sua
atividade ficcional, que é a capacidade de fundir a carnavalização do picaresco
com a atmosfera do alegórico. Dentro desses parâmetros é que se enquadra, no
meu entender, a maioria dos trabalhos de ficção de Nilto Maciel.
Mas é claro também que esta não é a
única perspectiva de assimilação de sua escritura literária, da mesma forma que
a classificação por ele mesmo proposta não esgota o enquadramento dos universos
ficcionais abordados. O conto intitulado “Insensatez”, por exemplo, podia muito
bem ser classificado como um conto de configuração urbana, assim como existem
aqueles que o autor reconhece como de procedência rural.
Esta variedade de temas e,
principalmente, de técnicas narrativas, pelo que se pode depreender de uma
paciente leitura do conjunto dos contos reunidos, emerge da inconformação do
autor de não mais aceitar as seduções da estética literária tradicional, bem
como da consciência de que é preciso reinventar a carpintaria da ficção, sob
pena do processo de criação converte-se em técnica de reportagem.
Em Punhalzinho
Cravado de Ódio existem contos de excelente concepção, como é o caso de “A
Arca”, “O Desafio de Facundo”, “O Fogo e a Luz”, “Quimera”, “Rede de Cobras” e
“Teoria da Desafiadura”, isto sem falar na estória que dá título ao volume, bem
como no interessantíssimo “Tadeu e a Mariposa”, este último um conto de
permanente interesse para o leitor, quer pela originalidade do enredo que
ostenta quer pela aura de criatividade que o reveste.
Trata-se, em verdade, de um livro que ao
leitor reserva agradáveis surpresas. A rigor, não existe uma ordem de leitura que
realmente corresponda à sequência dos contos. No entanto, tenho para mim que a
melhor opção de leitura seria aquela que começasse pelo último texto do livro.
Assim, o leitor seria mais facilmente arrastado por todo percurso do volume e,
de início, evitaria a difícil travessia que começa com a descoberta de “A Lenda
de um Reizinho – Capítulo Exótico” e termina com o último parágrafo do conto
“Esses Abraçadores da Morte”.
No entanto, apesar dessa recomendação,
é preciso igualmente que se mencione que a estória que abre o volume é uma
página de refinada sensibilidade, assim como belíssimo é o conto intitulado “A
Desilusão de Jonathan Swift”, o segundo que ali aparece.
Por fim, registre-se que em Punhalzinho Cravado de Ódio Nilto Maciel reencontra-se com o melhor da sua
produção, quer pela comprovação de que é realmente mestre na arte de contar
estórias inesperadamente fabulosas, quer pela sua obstinação de permanecer fiel
a uma temática e uma técnica literária particularíssimas. No mais, diga-se do
proveito que pode auferir o leitor com a assimilação da sua atmosfera criativa,
bem assim com o conhecimento da sua aventura picaresca e do seu discurso
alegórico e participativo.
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