Quando pensei em escrever as linhas
fundamentais do meu livro Pensadores Cearenses, foi Farias Brito um dos
primeiros nomes que defini para o projeto. A filosofia espiritualista por ele
desenvolvida, de forma original e soberana, talvez justifique o meu amor
renovado pela sua obra.
A mística panteísta de Alcântara
Nogueira, o fervor social da ideologia de Joaquim Pimenta, a metodologia da
pesquisa histórica de Capistrano de Abreu, o culturalismo filosófico de Djacir
Menezes, o normativismo democrático de Arnaldo Vasconcelos e a crítica social
de acento literário, que permeia a obra de Raimundo Antônio da Rocha Lima,
sempre me pareceram monumentos da cultura brasileira e orgulho supremo da
cultura cearense.
Nenhum momento da cultura
brasileira, no entanto, me parece superior à obra filosófica de Farias Brito. O
seu pensamento e a originalidade da sua expressão analítica, o mergulho
transcendente que empreendeu em busca da verdade e das formas superiores do
conhecimento ficarão pelos séculos tal uma luz misteriosa para os pensadores de
todas as idades.
Farias Brito é tão universal quanto
Kant, e a sua reflexão, plural e instigante, é tão importante para o homem quanto
a contribuição de Espinoza ou a mística de origem divina que reparte o mundo e
os sentidos maiores da contemplação.
Não precisou de escolas ou
universidades para comprovar ou desenvolver as suas teses, nem de legitimação
oficial para a proteção da sua pesquisa criadora; nem de doutrina pretérita precisou
Farias Brito para testificar as inquietações do seu ser em comunhão com a luz
soberba da razão.
Foi um criador de formas e sentidos
e um desbravador de códigos e dígitos esse pensador que Deus colocou na noite
escura do homem. Foi, portanto, um eleito, esse cearense pobre de São Benedito,
esse pária social elegante e desafortunado que o amor de Deus escolheu para
anunciar a nova lógica cultural que as forças materiais haviam sufocado.
Farias Brito nasceu no Ceará, nas
escarpas da Serra da Ibiapaba, onde se encrava atualmente o município de São
Benedito, aos 24 de julho de 1862, e faleceu no Rio de Janeiro, aos 16 de
janeiro de 1917.
Optou, como muitos brasileiros do
seu tempo, pelo bacharelado em Direito, formando-se em Ciências Jurídicas e
Sociais na Faculdade de Direito do Recife, em 1884.
Foi Promotor Público e Secretário
de Estado em sua província de berço, agitou a vida cultural do Ceará no último
quartel do século dezenove, e verberou as suas inquietações e os seus libelos
sociais na imprensa da época em que viveu.
Farias Brito fez-se Professor do
Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, através de memorável concurso, mas perdeu
o direito de nomeação para Euclides da Cunha. Porém, nada foi superior em sua
vida do que a paixão de ordem filosófica.
Poeta no início da sua trajetória,
Farias Brito tornou-se com o tempo o filósofo puro da reflexão e da
contemplação. A finalidade do mundo, a vida do espírito e a sua energia
inesgotável, os tormentos do ser e o triunfo final da vida interior – eis os
assuntos do seu particular afeto e da sua sede sempre renovada de pesquisa.
Autor de A Filosofia Como
Atividade Permanente do Espírito (1894), Filosofia Moderna (1899) e Evolução
e Relatividade (1905), que formam o tratado de Finalidade do Mundo,
Farias Brito publicou ainda O Mundo Interior (1914), A Base do
Espírito (1912) e Cantos Modernos (1889).
No Brasil e no mundo, muito já se
escreveu sobre a obra desse notável cearense, muito já se disse contra e a
favor da sua criação, mas a sua vida e o seu legado filosófico ainda constituem
um desafio para todos nós e especialmente para o escritor, Antônio Carlos
Klein, que se dispôs a tracejar o seu itinerário, num livro que ficará, por
certo, qual uma referência sobre a vida e a obra desse grande filósofo das
Américas e da civilização do Hemisfério Sul.
Refiro-me ao último volume da
coleção Terra Bárbara, das Edições Demócrito Rocha, que traz por título
justamente o nome do homenageado desta resenha, e que foi escrito com
paixão e seguro domínio do seu objeto de pesquisa.
Autor da biografia de Paulo
Bonavides, publicada no âmbito da mesma coleção, ofereceu-nos, em seguida,
Antônio Carlos Klein, o Perfil Biográfico de Farias Brito (Fortaleza:
Edições Demócrito Rocha, 2004), firmando assim o seu nome como uma das
expressões da nova geração de pesquisadores do Brasil.
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