Dimas
Macedo
Giselda Medeiros
A expressão da crítica literária
cearense e a sua inserção na cultura brasileira é uma das nossas tradições mais
afortunadas. O pioneirismo de Rocha Lima (1855-1878) e do seu clássico Crítica
e Literatura (São Luiz, Typografia do Paiz, 1878) parecem-me
exemplos que se bastam a remarcar essa tradição e essa tenacidade, próprias da
nossa inteligência criadora.
Em 1856, como sabemos, José de
Alencar publicou a sua memorável Carta
Sobre a Confederação dos Tamoios, de grande repercussão na crítica
literária do Brasil, e, em 1872, Franklin Távora fez um ajuste de contas com o
seu conterrâneo, com a edição das suas conhecidas Cartas a Cincinato.
E como se isso não bastasse,
Araripe Júnior, ainda no século dezenove, encarregar-se-ia de dar à literatura
brasileira o seu estatuto definitivo no terreno da crítica. E bem assim os
rumos que esse gênero literário tomaria entre nós.
Depois, eu colocaria o papel relevante das Cartas
Literárias (Rio, 1895) de Adolfo Caminha, o engenho crítico e a argúcia
intelectiva de Frota Pessoa (Crítica e Polêmica, 1902), a essencialidade
do exercício crítico de Braga Montenegro, as intuições estruturalistas de F. S.
Nascimento e a crítica de base dialética de Ramos Tinhorão reunia em – A Província e o Naturalismo.
A crítica literária de formação
acadêmica tem-se desenvolvido no Ceará com algum desassombro. Lembro aqui os
nomes de Linhares Filho, Batista de Lima, Lemos Monteiro e Sânzio de Azevedo, e
ponho em destaque o nome deste último, que é o maior historiador da nossa
literatura.
Merece também uma referência
memorável o recorte teórico que permeia o tirocínio crítico de Pedro Paulo
Montenegro, e trago à discussão os nomes de alguns poetas que exerceram ou
exercem, entre nós, a crítica literária. Aluísio Medeiros, Francisco Carvalho e
José Alcides Pinto entre esses poetas a que me refiro.
Agora, quem aspira a inscrever-se
nessa tradição afortunada, é a escritora Giselda Medeiros, uma das mais argutas
expressões da nossa intelectualidade e do nosso panorama cultural, reunindo, em
livro, os seus artigos de crítica, escritos entre 2005 e 1999 e pulverizados em
diversos espaços nos quais se fez presente com a sua inteligência e a sua
sensibilidade criativa.
Giselda já firmou o seu nome como
poetisa e já se revelou, de permeio, como uma das nossas contistas mais
imaginosas. Contista da condição humana e do imponderável, onde Eros e Tanatos
se abraçam. Poetisa também de escol, que paga tributo à lírica e à arte
literária de qualidade estética relevante.
Crítica Reunida – 2005/1999
é o livro da sua diversidade e do seu engenho sofisticado e ambicioso. Sei que
falar em ambição, no caso de Giselda, é agredir um pouco a sua sensibilidade.
Mas a sua ambição literária faz-se exatamente contra a sua vontade, e a partir
da sensibilidade com que dissemina no texto as marcas do seu tirocínio teórico.
Não raro, nos seus textos, fazem-se presentes o sistema literário e o
contexto teórico em que insere o postulado das suas recensões, as quais saltam
aos olhos como testemunho de erudição. Giselda não faz política de jornalismo
literário tão-somente. Mais do que isso, ela nos mostra o seu viés estético e
as suas linhas de pesquisa em busca das formas supremas da arte literária.
A leitura para Giselda é um
pretexto e não uma contingência aleatória. E o texto de crítica que a autora elabora
é mais que uma instância comunicativa de acento verbal, pois nele se agrega
igualmente um valor e, não raro, um sentido filosófico e uma perspectiva
ontológica muito proveitosa. E esses traços me parecem ser aquilo que remarca o
seu estilo e a sua discussão, a sua engenharia linguística e a sua busca
incessante de conhecimento.
Para Giselda Medeiros, a crítica
literária é metacriação e não apenas desvelamento e argúcia para com a
intelecção do texto literário. E, dessa forma, a autora nos vai revelando a
poética da crítica literária que empreende, isto é, faz da estética do seu
texto o pano de fundo das suas intenções e dos seus acertos no campo literário.
O que destacar no seu livro? Creio
que tudo em Crítica Reunida – 2005/1999 - está sincrônico com o
pensamento literário de Giselda e com a expectativa do leitor que dele se
acerca. O livro condensa um conjunto de recensões e ensaios de diversas épocas
e oportunidades.
Em todos os textos reunidos, é
possível vislumbrar a maturidade de Giselda Medeiros, a sua argúcia literária,
a sua austeridade acadêmica, o seu potencial analítico e, acima de tudo, a sua
possessão estilística e as marcas inconfundíveis do seu talento e da sua
indiscutível leveza, em busca das formas puras da comunicação.
O rigor metodológico está presente
em Crítica Reunida – 2005/1999 - como em nenhum outro livro de crítica
publicado no Ceará nos últimos anos. No livro existem referências
bibliográficas de monta, alinhamento de uma bibliografia no final do volume e
um índice onomástico que facilita em muito a consulta de cada um dos textos ou
a localização do discurso teórico no qual Giselda apoiou as suas conclusões e
os seus pontos-de-vista.
Louvo, por fim, a decisão da autora
de assumir, de público, a maternidade desse novo gênero literário, e a decisão
também de incorporá-lo, definitivamente, ao estuário da sua multifacetada
visão. Giselda não é escritora de poucos recursos literários. É proprietária de
sonhos e de um patrimônio literário que todo o Ceará já aprendeu a cultuar. Que
seja assim também o destino e a recepção deste indispensável Crítica Reunida
– 2005/1999.
Dimas, muito obrigada pela publicação de sua crítica ao meu livro e, ainda mais, postada em seu rico blog.
ResponderExcluirAmigo, você é o Cara!
Abraços
Giselda