Dimas
Macedo
Separei-me da crítica e já não tenho habilidades para fazer uma resenha.
Tenho lido romances e coleções de contos que agradam, como é o caso de Separação, de Clauder Arcanjo (Mossoró:
Sarau das Letras, 2017), contudo, após a leitura, as ideias se dissipam e se
contorcem como se fossem sarças.
Tenho consultado críticos de renome, como Vera
Oliveira e Dias da Silva, mas eles apenas me confundem. Dizem que a crítica não
existe e que sou um visionário em busca de uma mãe, e que a ausência que
sentimos da mãe, transforma-se num princípio de dissolução que nos leva para a
criação da arte. Citaram Freud e depois Montaigne, Ulisses e Guy de Maupassant.
Pediram-me os escritores Sânzio
de Azevedo e o Batista de Lima que eu rezasse pensando na alma de Araripe
Júnior, de Antônio Cândido ou de Braga Montenegro, e que fosse até Belo
Horizonte e pedisse para o Fábio Lucas alguma sugestão para continuar
escrevendo, mesmo diante da morte da crítica e do ensaio.
Disseram-me,
ademais, esses dois escritores, que o Clauder Arcanjo nunca seria um Machado de
Assis, e que Licânia era apenas um pontinho no mapa diante da Macondo de García
Márquez. E acrescentam que a Comala de Rufo ou a Santa Maria de Juan Carlos
Onetti eram superiores a esse lugarzinho sem eira nem beira, povoado de búfalos
e dragões.
E se não era Campanário, a cidade
mítica de Audifax Rios, perguntei se estavam falando de Alcides Pinto, o
criador de demônios e dragões, que viera da gente de Licânia, mas achei que
estavam cobertos de razão, especialmente, quando Sânzio de Azevedo se referiu à
utopia que Batista de Lima chamou de Tabocal.
Quanto às minhas ilusões de
crítico literário, pensei: “Freud, que seja, lembrando os ensaios de Vera
Oliveira reunidos em O Beijo da Mãe
(Brasília: Thesaurus, 2017), mas Dias da Silva, jamais, pois não se pode mesmo
confiar em um crítico nascido em Mangabeira”!
Durante toda a minha vida, nada mais
fui do que um princípio de dissolução. Daí eu ter me identificado tanto com o
novo livro do autor de Licânia, que
disse, certa feita, ter se inspirado num poema meu para escrever um dos seus
contos mais conhecidos.
Duvido que isso tenha acontecido, apesar do autor ter usado uma epígrafe
de minha autoria no início de um dos seus textos. Na época, achei a coisa um
pouco exagerada, mas depois, de forma vaidosa, fui me acostumando com o fato de
ser um escritor referido por um grande contista.
“O deserto da alma, poeta, foi que me levou a escrever Separação, a melhor coisa que consegui
realizar, o que me deixa um pouco apreensivo, pois não tenho mais jeito para
cavoucar as ideias. Acho que a minha medida saiu um pouco do lugar. Não sei mais
o que contar, porque, igualmente, acho que já menti de forma exagerada”.
Esta
confidência do Clauder, me pegou de surpresa e me deixou um pouco abobalhado, pois,
ao que sei, trata-se de um escritor de sucesso, de um leitor voraz e
compulsivo, que sabe o quanto custa A
Consciência de Zeno, e que teve a coragem de dizer que Ana Karenina é uma
grande personagem.
Claro que o autor de Licânia (Mossoró:
Sarau das Letras, 2007) sabe o que é uma estória curta, mas em Separação tornou-se tão econômico com o
verbo, que terminou resumindo o seu primeiro conto a uma revoada de pássaros,
como se o casamento fosse um ato de suspensão da vida.
Daí em diante, Clauder tomou uma tesoura, fez uma coivara dos textos e
os nubentes nunca mais foram os mesmos. Até eu me separei da crítica e divorciei-me
da literatura como se fosse morrer de verdade.
Achei, então, que estava imitando
Machado de Assis, o mais inacessível dos nossos escritores e o mais denso e
sutil dos nossos romancistas, ainda hoje repetindo em nossa consciência as
lições que nos levam à beira do abismo.
Separei-me da crítica, sim, mas
para viver com a proposta pregada
pelo Clauder Arcanjo: separações plurais, separações sem fim, porque, leitores,
o casamento entre pessoas jamais existiu, e porque a vida é uma separação entre
o que existe e aquilo que nunca se tornou possível.
Barro Preto (CE), 1º/06/2018
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