Dimas Macedo
A literatura cearense
acha-se razoavelmente estudada pela historiografia e pelos aportes da crítica e
do ensaio literário, graças, principalmente, aos esforços de Dolor Barreira e
Sânzio de Azevedo. O primeiro debruçou-se sobre as suas fontes, documentadas
por historiadores de outras áreas do conhecimento, e o segundo, fez a
condensação de todas essas fontes, sistematizou aquilo que passou ao largo das
visões superficiais, e deu à nossa história literária, o seu critério de
cientificidade e rigor metodológico.
Sânzio destaca-se, ademais, pelos
estudos sistemáticos dedicados a instituições do nosso passado literário e
pelos seus ensaios acerca de poetas e prosadores de talento, cujas produções elevam-se
por sua importância e pela qualidade.
As contribuições de Otacílio
Colares (Lembrados e Esquecidos),
Artur Eduardo Benevides (Evolução da
Poesia e do Romance Cearense), Braga Montenegro (Natureza e Evolução do Conto Cearense) e aquilo que registrei nos
meus livros Leitura e Conjuntura
(1984), A Metáfora do Sol (1989), Crítica Imperfeita (2001) e Ensaios e Perfis (2004) constituem,
igualmente, fontes que merecem ser repassadas.
A partir da década de 1970, quando
foi publicado o livro Literatura Cearense,
de Sânzio de Azevedo, o Curso de Letras da UFC passou a assumir uma vanguarda
nesse campo de estudos, especialmente naquilo que interessa à análise e interpretação
da obra dos nossos escritores, feitas, inicialmente, pelos seus professores e,
posteriormente, pelo seu corpo discente.
Ali foram divulgados ensaios e teses
de mestrado sobre a produção de autores do porte de Francisco Carvalho, Moreira
Campos, José Alcides Pinto, Eduardo Campos, Artur Eduardo Benevides, Pedro Lyra
e Rachel de Queiroz; e pesquisas sobre instituições como a Padaria Espiritual e
o Grupo Clã.
Difundiu-se, também, no Curso de
Letras da UFC, a realização de seminários e a formação de grupos de pesquisa
que dirigiram os seus olhares para a literatura cearense, atividade exitosa de
que é exemplo o livro que ora se publica – Percursos
da Literatura no Ceará (Fortaleza: Expressão Gráfica, 2017), o qual constitui
um dos melhores conjuntos de ensaios sobre a nossa produção literária.
O livro comporta uma visão
panorâmica, contemplando escritores de todas as idades, cujas obras,
indiscutivelmente, têm a sua relevância e clamam pela sua interpretação e
leitura, cabendo, aqui, ressaltar os exemplos de José de Alencar e Juvenal
Galeno, os dois escritores cearenses da minha maior predileção.
As releituras de A Normalista,
de Adolfo Caminha, e Dona Guidinha do
Poço, de Oliveira Paiva, pagam tributos à transição de nossa literatura e
ao salto de qualidade com a qual ela se impôs, na virada do século dezenove
para o século vinte, onde o realismo se fez uma presença mais do que marcante,
tendo-se em vista, fundamentalmente, a produção destes romancistas.
Os ensaios dedicados à obra
teatral de Carlos Câmara e Eduardo Campos – induvidosamente, os nossos
maiores teatrólogos – chamam a atenção do leitor. A importância destes
escritores, para além da qualidade das suas criações, reside num ponto que
considero de vital importância: a exposição dos nossos costumes e a denúncia
das nossas contradições, no plano social.
No âmbito de todas as
culturas, situam-se o mito e a parlenda, a carnavalização da história e os
engenhos faustosos do picaresco, que, às vezes, nos levam ao armorial. Nesse
caso, um dos artigos reunidos se volta para essa seara, aí contemplando as
astúcias e artimanhas de João Grilo, tecidas por Arievaldo Viana e Francisco Melchíades.
A ficção de Rachel de Queiroz, Moreira Campos, Airton Monte, Socorro
Acioli, Jards Nobre e Caio Porfírio Carneiro, e a poesia de Roberto Pontes aparecem
expostas neste livro, em menor ou maior proporção, destacando-se, entre os
ensaios reunidos, um panorama da crônica cearense, traçado por Maria Lílian
Martins de Abreu.
Fernanda Diniz, de sociedade com Alexandre Vidal de Sousa, Fernângela
Diniz da Silva e Francisco Wellington Rodrigues Lima, cuidam da organização do
volume Percursos da Literatura no Ceará,
e nos dão, desta forma, um testemunho de amor aos nossos escritores.
Trata-se de livro produzido no âmbito do projeto Ceará em Letras, que é o marco, talvez, de maior expressão da nossa
pesquisa literária, nos dias atuais, e a cujas raízes ligam-se os nomes de
Fernanda Diniz e Jailene de Araújo Menezes.
Irmano-me com os organizadores desse
livro e a todos agradeço o convite para escrever o seu prefácio. Recebo-o como
homenagem ao trabalho de pesquisa que realizei, tendo como foco a nova
literatura cearense, pois de outra forma não saberia entender a deferência.
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