terça-feira, 23 de janeiro de 2018

Literatura no Ceará

       Dimas Macedo


           A literatura cearense acha-se razoavelmente estudada pela historiografia e pelos aportes da crítica e do ensaio literário, graças, principalmente, aos esforços de Dolor Barreira e Sânzio de Azevedo. O primeiro debruçou-se sobre as suas fontes, documentadas por historiadores de outras áreas do conhecimento, e o segundo, fez a condensação de todas essas fontes, sistematizou aquilo que passou ao largo das visões superficiais, e deu à nossa história literária, o seu critério de cientificidade e rigor metodológico.

            Sânzio destaca-se, ademais, pelos estudos sistemáticos dedicados a instituições do nosso passado literário e pelos seus ensaios acerca de poetas e prosadores de talento, cujas produções elevam-se por sua importância e pela qualidade.

            As contribuições de Otacílio Colares (Lembrados e Esquecidos), Artur Eduardo Benevides (Evolução da Poesia e do Romance Cearense), Braga Montenegro (Natureza e Evolução do Conto Cearense) e aquilo que registrei nos meus livros Leitura e Conjuntura (1984), A Metáfora do Sol (1989), Crítica Imperfeita (2001) e Ensaios e Perfis (2004) constituem, igualmente, fontes que merecem ser repassadas.

             A partir da década de 1970, quando foi publicado o livro Literatura Cearense, de Sânzio de Azevedo, o Curso de Letras da UFC passou a assumir uma vanguarda nesse campo de estudos, especialmente naquilo que interessa à análise e interpretação da obra dos nossos escritores, feitas, inicialmente, pelos seus professores e, posteriormente, pelo seu corpo discente.

           Ali foram divulgados ensaios e teses de mestrado sobre a produção de autores do porte de Francisco Carvalho, Moreira Campos, José Alcides Pinto, Eduardo Campos, Artur Eduardo Benevides, Pedro Lyra e Rachel de Queiroz; e pesquisas sobre instituições como a Padaria Espiritual e o Grupo Clã.

            Difundiu-se, também, no Curso de Letras da UFC, a realização de seminários e a formação de grupos de pesquisa que dirigiram os seus olhares para a literatura cearense, atividade exitosa de que é exemplo o livro que ora se publica – Percursos da Literatura no Ceará (Fortaleza: Expressão Gráfica, 2017), o qual constitui um dos melhores conjuntos de ensaios sobre a nossa produção literária.

           O livro comporta uma visão panorâmica, contemplando escritores de todas as idades, cujas obras, indiscutivelmente, têm a sua relevância e clamam pela sua interpretação e leitura, cabendo, aqui, ressaltar os exemplos de José de Alencar e Juvenal Galeno, os dois escritores cearenses da minha maior predileção.

          As releituras de A Normalista, de Adolfo Caminha, e Dona Guidinha do Poço, de Oliveira Paiva, pagam tributos à transição de nossa literatura e ao salto de qualidade com a qual ela se impôs, na virada do século dezenove para o século vinte, onde o realismo se fez uma presença mais do que marcante, tendo-se em vista, fundamentalmente, a produção destes romancistas.

           Os ensaios dedicados à obra teatral de Carlos Câmara e Eduardo Campos – induvidosamente, os nossos maiores teatrólogos – chamam a atenção do leitor. A importância destes escritores, para além da qualidade das suas criações, reside num ponto que considero de vital importância: a exposição dos nossos costumes e a denúncia das nossas contradições, no plano social.

            No âmbito de todas as culturas, situam-se o mito e a parlenda, a carnavalização da história e os engenhos faustosos do picaresco, que, às vezes, nos levam ao armorial. Nesse caso, um dos artigos reunidos se volta para essa seara, aí contemplando as astúcias e artimanhas de João Grilo, tecidas por Arievaldo Viana e Francisco Melchíades.

          A ficção de Rachel de Queiroz, Moreira Campos, Airton Monte, Socorro Acioli, Jards Nobre e Caio Porfírio Carneiro, e a poesia de Roberto Pontes aparecem expostas neste livro, em menor ou maior proporção, destacando-se, entre os ensaios reunidos, um panorama da crônica cearense, traçado por Maria Lílian Martins de Abreu.

          Fernanda Diniz, de sociedade com Alexandre Vidal de Sousa, Fernângela Diniz da Silva e Francisco Wellington Rodrigues Lima, cuidam da organização do volume Percursos da Literatura no Ceará, e nos dão, desta forma, um testemunho de amor aos nossos escritores.

          Trata-se de livro produzido no âmbito do projeto Ceará em Letras, que é o marco, talvez, de maior expressão da nossa pesquisa literária, nos dias atuais, e a cujas raízes ligam-se os nomes de Fernanda Diniz e Jailene de Araújo Menezes.


           Irmano-me com os organizadores desse livro e a todos agradeço o convite para escrever o seu prefácio. Recebo-o como homenagem ao trabalho de pesquisa que realizei, tendo como foco a nova literatura cearense, pois de outra forma não saberia entender a deferência.

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