Dimas Macedo
Jurista Rosaura de Brito Bastos
Jürgen Habermas, o filósofo por excelência
da modernidade, afirma – com bastante propriedade, aliás –, que o esgotamento
dos paradigmas, quer no campo da pesquisa doutrinária, quer na área da reflexão
sobre os objetos múltiplos do conhecimento, aponta para a crise generalizada
que afeta os valores da cultura e da civilização.
Somente a edificação de novos paradigmas,
inclusive no espaço da ética e das convenções do mundo do direito, se bastaria,
no caso, a emprestar sentido ao recorte maduro do humano e às suas formas
plurais de convivência e de alteridade.
A ética da discussão e a questão (sempre
renovada) da busca da verdade interessariam mais ao campo do direito do que os
modelos tradicionais do positivismo e da legislação. A retomada da filosofia (e
da filosofia em todos os ramos do direito) como ponto de partida da democracia:
eis o que importaria abordar, tanto na hermenêutica jurídica de ordem positiva,
quanto nos processos jurídicos em fase de mudança.
E enquanto a reflexão jurídica, no Brasil,
não chega a esse nível de discussão e aprimoramento, urge avaliar os avanços e
as estimativas verificadas nos nossos mestrados em Direito, locus
privilegiado onde as boas novas são anunciadas, e de onde se espraiam para as
livrarias e para o mercado (cada vez mais competitivo) dos operadores do
direito.
Do cerne de um desses Cursos de Mestrado –
no caso o Curso de Mestrado em Direito da UFC – é que surge o livro – Improbidade
Administrativa – Conteúdo Jurídico e Dimensão Jurisdicional (Belo Horizonte, Editora Fórum,
2004), de Rosaura Bastos, minha aluna fraterna na graduação e, por último,
minha colega de Magistério Universitário.
Louvo, de primeiro, a sua sede de
conhecimento, o seu ministério de Procuradora e de Advogada, e a sua postura de
professora de Direito Constitucional e Ciência Política; e assinalo, de agora,
a oportunidade para recomendar ao leitor o tirocínio jurídico e os vernizes
formais e linguísticos que perpassam o conteúdo e a estética da sua produção.
Com a probidade administrativa um novo
universo jurídico definitivamente foi instaurado entre nós, quer pelo fato de
que a probidade é exigência inafastável da moralidade, quer pelo fato de que a
Constituição é o seu novo parâmetro no campo normativo.
As normas da moralidade e da probidade
administrativas possuem hoje o seu acento constitucional indiscutível. E mais:
constituem vetores da Constituição Federal de 1988; e vetores principiológicos
de autoridade hermenêutica vinculante, mormente tendo-se presente a questão dos
princípios e dos direitos constitucionais deles decorrentes.
Há de se ponderar, igualmente, que a questão
da probidade entende com a eficácia do direito administrativo, uma vez que
elege o mérito, o conteúdo e a finalidade do Ato como forma de concretização
dos Princípios da Administração. Não é mera exigência legal, tão-somente. É
exigência de ordem pública que se imbrica com a qualidade e a eficiência do
discurso da Constituição.
No plano da legislação infraconstitucional,
faz-se indispensável que se ponha em destaque a Lei Federal nº 8.429, de 02 de
junho de 1992, que disciplina a tutela da improbidade administrativa, tipifica
a conduta ímproba dos agentes públicos e assim também as sanções de natureza
penal e civil que lhe são correlatas. Constitui, referida lei, um sistema
normativo de alcance nacional e de aplicabilidade geral e indistinta,
explicitando, a seu turno, como se pode igualmente observar, os casos de
responsabilidade disciplinar que importam em dano ao erário e ao patrimônio de
ordem oficial.
A improbidade como delito disciplinar, os
tipos disciplinares que configuram enriquecimento ilícito e que causam prejuízo
ao erário, os tipos disciplinares que atentam contra os Princípios da
Administração, a prescrição dos atos de improbidade e a reparação dos danos
cometidos contra os entes estatais: eis a matéria que a Lei Federal em comento
elevou ao plano de norma jurídica cogente, com poder de aplicação geral e imediata.
No início da sua exposição, de forma muito
inteligente, a autora aborda os princípios constitucionais que regem o desenho
da matéria, no caso os princípios da Moralidade, da Legalidade, da
Impessoalidade, da Publicidade e da Eficiência, revelando-nos a importância
desses princípios para a abordagem do texto legal mencionado, e para a
compreensão segura da doutrina que lhe é consequente.
Em seguida, discorre a Professora Rosaura
sobre os mais diversos sistemas de controle que regem a eficácia da probidade
administrativa, enfocando os controles de natureza interna e externa e os seus
desdobramentos na área do Executivo, do Legislativo e do Judiciário, pondo em
destaque o controle da atividade discricionária e o controle dos atos políticos
nos chamados crimes de responsabilidade.
Já no pertinente à Lei 8.429, de 02 de junho
de 1992, a autora lhe empresta, neste ponto, um tratamento jurídico respeitoso
e uma exegese normativa excelente, analisando, ademais, todos os aspectos
possíveis que remarcam as dimensões subjetivas e objetivas do problema.
A aferição da bibliografia, a
meticulosidade da pesquisa, o domínio dos conceitos e a hermenêutica da
legislação e da jurisprudência, que cercam o conhecimento do assunto, fazem
desse livro um dos melhores textos que, no Brasil, se editaram sobre o assunto;
e fazem da sua autora também uma das nossas juristas mais argutas, quer pelos
conhecimentos que veicula, quer pelo trato que dá ao seu objeto de pesquisa.
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