Dimas Macedo
Comemoro
os meus sessenta anos saboreando aquilo que mais aprecio: os prazeres da
Literatura e o gosto sereno das palavras com as quais reinvento as minhas
travessias. Dolorosa seria a minha vida se eu não pudesse ser o escritor no
qual me transformei.
Sou
um amante excessivo do desejo, um esteta cuja expressão nunca é alcançada, um
ser carnal e resoluto, um agiota da música e do silêncio, um místico cuja
obsessão é a ausência ou o triunfo supremo da linguagem.
Existencialista até a medula de todos os sentidos, não espero da vida
senão a energia para continuar amando, senão a renúncia de tudo aquilo que
aspiro, senão a fuga em busca das respostas, senão a solidão e os vinhos com os
quais alimento os meus heterônimos.
Sei
que o poeta, o homem e jurista que representei irão sucumbir, silenciosamente,
após a minha morte; e que ficarei, talvez, qual um retrato na mente de um
amigo, qual uma corda lançada no abismo, em busca daquilo que nunca será
encontrado.
Diante dos sessenta anos, percebo o tamanho da minha pequenez e da minha
insignificância. Sei que nada sou, que nada serei e que as minhas cinzas serão
esquecidas, que os meus livros e os meus registros serão apagados e que viverei
em poucos corações, e que apenas o corpo de um Anjo provou o sal da minha boca.
Confesso que nada tenho para confessar, que nenhuma palavra me resta
dizer e que este texto foi escrito em testemunho do meu esquecimento e em
tributo à vida da forma como eu a vivi: livre, desembaraçada, aberta, recheada
de defeitos e inacabada como a minha obra literária.
Do
que posso me orgulhar de ter feito? Orgulho-me porque eu trouxe ao mundo a
existência dos meus filhos, porque me entreguei ao Amor quando eu achava que a
vida já tinha terminado.
Todos
os tecidos da existência são solúveis, e todos os desejos que nascem, a tirania
dos homens procura reprimir com as suas normas desumanas. Eis a religião na
qual acredito. O resto será a paródia da vida e o silêncio, e a composição de
um poema que nunca será terminado.