Linda Lemos Bezerra
Dois homens que deixaram rastros por onde
passaram. Suas histórias se confundem e são dignas de serem lembradas. Se
ninguém vale pelo que sabe, mas pelo que faz com aquilo que sabe, eles são
exemplos. Amantes
de suas raízes cearenses, eles nasceram
na velha Princesa do Salgado, nas terras banhadas pelas águas que correm para o Boqueirão, abraçadas
com as águas do Riacho do Machado. O Sítio Calabaço foi o
primeiro abrigo de José Zito de Macedo (Zito Lobo), que nasceu aos 29 de
novembro de 1922, e do seu filho Dimas Macedo, que veio três décadas depois,
aos 14 de setembro de 1956.
Os dois identificam-se fortemente
com a vida no campo. Tranquilos, serenos, sem ambição e destemidos. Seus
valores somente os compreendem os conhecedores das leis do sertão: respeito à
natureza, justiça social, dignidade e muito trabalho. “A simplicidade da
expressão gestual discreta e cativante, de característica marcadamente paternal
e afetiva” caracteriza Zito Lobo, “modelo de pai e
de amigo, e de esposo fiel e generoso, sendo esteio de amparo e proteção para
toda a família”, segundo Dimas Macedo;
porque Zito Lobo foi testemunho de amor, carinho, dedicação, zelo pela família,
pelo povo, pelas lideranças de pastorais e movimentos por ele organizados,
firmes e radicados na palavra e na fé em Deus.
“Quando se refere à
literatura, Dimas Macedo declara sobre o poeta Zito Lobo: “Mesmo acompanhando
de perto, durante algum tempo, a sua dedicação à vida literária, jamais me
acorreu a ideia de que, no final dos seus dias, a sua criação viesse a assumir
tamanha gravidade, e de que o seu espólio de poeta estivesse praticamente
pronto para o prelo”.
“Sabia ele, no entanto, do
significado e do valor que permeavam a tessitura dos seus versos, e sabia, mais
do que isso, que eu jamais me furtaria ao compromisso que um dia lhe fizera de publicar uma seleção
dos seus poemas”.
“Dessa circunstância é que nasceu a
edição de Trovas e Poemas (Fortaleza,
Editora Oficina, 1990; 2ª edição: Fortaleza, Edições Poetaria, 2011), volume no
qual decidi reunir, de forma rigorosa, os seus poemas produzidos após a morte
da minha mãe, Maria Eliete de Macedo, aos 10 de outubro de 1975”.
“Da emoção e do enlevo que sempre
costuraram as suas atitudes, ele não se furtou de falar ao silêncio da sua
escritura literária, tecendo trovas, poemas e sonetos temperados pela coloração
das lembranças e das recordações; e poemas que despertaram a atenção de
escritores do porte de Joaryvar Macedo (de quem era irmão unilateral) e José
Alcides Pinto, que escreveram, efusivamente, sobre a sua obra literária”.
Mas quem sou
eu para falar de poesia? Não se pode negar, entretanto, as evidências. Os dois
poetas se confundem em suas ideias. Semelhanças essenciais entre a
sensibilidade e inteligência aproximam Zito Lobo e Dimas Macedo. Eles fazem
lembrar Fernando Pessoa e Luís de Camões, naquilo que se refere à
consciência do valor da poesia. É comum a Pessoa e a Camões a afirmação do
valor supremo da poesia. Camões sabe que só o canto dos poetas transforma os
homens em seres imortais (só o poeta nos liberta da lei do esquecimento).
Pessoa sabe que só a criação de mitos (tarefa do poeta) assegura a vitalidade
da Pátria, porque a poesia é o Império vivo. E nesse sentido, Lavras da
Mangabeira e Portugal se confundem quando falamos de poesia.
Ressalte-se que quando se
trata de literatura, Dimas Macedo torna-se grande. Iniciou os estudos em sua
terra natal, até chegar a Fortaleza, onde se bacharelou em Direito, em 1981.
Exerceu, na juventude, as funções de jornalista, optando, posteriormente, pela
carreira de escritor e de jurista. Dimas é crítico
literário, poeta, ensaísta e historiador, Professor da Universidade Federal do Ceará,
membro da Academia Cearense de Letras e da Academia de Letras e Artes do
Nordeste e autor dos livros de poemas:
A Distância de Todas as Coisas (1980, 3ª ed. 2001), Lavoura Úmida (1990, 3ª ed. 2010), Estrela de Pedra (1994, 2a ed. 2005), Liturgia do Caos (1996),
Vozes do Silêncio (2003) e Sintaxe do
Desejo (2006). No campo da crítica ou do ensaio, são de sua autoria: Leitura e Conjuntura (1984, 3a ed.
2004), A Metáfora do Sol (1989, 3ª
ed. 2003), Ossos do Ofício (1992), Crítica Imperfeita (2001), Crítica Dispersa (2003), Ensaios e Perfis (2004) e A Letra e o Discurso (2006).
A religiosidade e o misticismo são
características marcantes, comprovadas no amor que pai e filho devotam ao
Criador. “Sou um homem fascinado por Deus e vocacionado para
Deus. Não tenho receio algum em proclamar o meu amor a Deus e viver a minha
vida para Deus. A minha primeira essência é a mística. A poesia vem em segundo.
E a filosofia em terceiro. Mas a literatura é o linho e a linha que me foram
dados para interpretar o mundo e para viver no limite de todas as coisas”,
registra Dimas Macedo. Ambos conseguem
realizar, sem necessariamente fazer parte do grupo dos "mestres da suspeita", alvo de intensa crítica nos seus
ideais, nas suas esperanças e nas suas grandes realizações históricas.
Quanto a Zito Lobo transferiu-se para Fortaleza, em
1975, fixou residência no Bairro da Piedade, onde se tornou figura popular. Com
sua religiosidade em evidência, atuou como Cooperador Salesiano junto à
Paróquia da Piedade, ali integrando a Associação do Sagrado Coração e a
Associação de Nossa Senhora Auxiliadora, desempenhando funções de direção junto
à Associação dos Merceeiros do Ceará e ao Círculo Operário dos Trabalhadores
Cristãos – núcleo regional do Bairro da Piedade.
Na língua portuguesa, pai, proveniente
do latim
pater, também interpretado como pátre, patris, possui
vínculos com a palavra padre, tendo ramos e origens
semelhantes, a partir do costume de se chamar o clérigo de pai. Comumente, o
termo patre assume um cunho
religioso, proveniente da igreja
cristã e da judaica,
sendo um dos epítetos de Deus.
Também é a primeira pessoa da Santíssima Trindade,
paixão desmedida entre pai e filho.
Afora a militância de ordem literária e religiosa,
Zito Lobo ostenta trajetória de vida com participação e desejo de realização do
social. Em Lavras, torna-se um dos
fundadores do Círculo Operário dos Trabalhadores Cristãos, de cujo núcleo
regional foi Presidente. Foi um dos fundadores do Sindicato dos Trabalhadores
Rurais, sendo um dos instituidores, na gestão em que foi Tesoureiro de referido
Sindicato, da Cooperativa dos Trabalhadores Rurais de Lavras da Mangabeira, que
igualmente dirigiu, ostentando sempre sua liderança carismática.
Descendente dos desbravadores que
construíram a civilização do Cariri, filho de Maria de Aquino Macedo e de Antônio Lobo de Macedo (Lobo
Manso), uma das legendas da poesia popular do Ceará, José Zito de Macedo (Zito
Lobo) é hoje nome de Rua em Fortaleza e em sua cidade natal, num reconhecimento
aos seus melhores atributos.
Zito
Lobo e Dimas Macedo, dois amores, queridíssimos pelos amigos, duas vidas
dedicadas à família. Felizes, cheios de planos, ideais, sonhos, pai e filho
caminham em direção à felicidade, à esperança e à alegria que fazem parte dos
sentimentos multiplicados. Não há divisão entre eles quanto ao amor dedicado a
familiares e amigos. Juntos, felizes, cheios de vida. Um só coração. Uma só
alma. Num dia, o primeiro deles resolveu pegar um atalho e, no atalho, a vida
nunca mais foi a mesma. Algo se quebrou no tempo e a esperança se foi,
permanecendo apenas o amor que não se cansa da solidão entre duas vidas.
Todos os anos, em pelo menos treze
países, é celebrado o Dia dos Pais. A comemoração teve
origem nos Estados Unidos, em 1910, e
partiu da ideia de Sonora Louise Smart Dodd. A data foi oficializada pelo presidente
Richard Nixon, em 1972, como sendo
no terceiro domingo de junho. A data, porém, varia de país para país, tendo a
maioria adotado o mês de junho. No Brasil, o mês é agosto. Dimas escolheu os
noventa anos de Zito para celebrar o dia dos pais, o dia do pai venerado, falecido em Fortaleza, aos
24 de março de 1987.
Me chama atenção o que foi dito no início do texto: ninguém vale pelo que sabe, mas pelo que faz com aquilo que sabe. Quem somos nós se não soubermos usar o que sabemos? E quem somos nós se não soubermos amar aqueles que fazem parte de nossas vidas? Uma extrema demonstração de sensibilidade o fato de se comemorar o 'dia dos pais' na data do aniversário do pai.
ResponderExcluirDuas características de Dimas sempre me chamaram a atenção: seu apoio ao escritor iniciante e sua religiosidade. Agora entendo que sua fé inabalável vem de muito longe e sua generosidade também.
ResponderExcluirÉ venerável que nos dias atuais, enquanto tantos ficam imersos na rotina de suas funções, enfurnando-se cada vez mais em suas "tocas", ainda há outros tantos quanto o poeta Dimas que exploram e incorporam a pluripotencialidade do ser humano, enveredando em ramos à primeira vista tão diferentes, mas que no final das contas são todos uma só face do homem, a mais bela. Fica então, o recado para os emergentes juristas, que façam do Direito apenas uma de suas diversas formas de interagir com o mundo, dentre tantas, variadas e louváveis.
ResponderExcluirFernanda França, Lourdinha Leite Barbosa e Angelo Carlos Silva Queiroz, li os comentários acima e sou grato a vocês pela interação com o meu Blog. Forte abraço.
ResponderExcluirNão posso falar de Zito Lobo, pois, infelizmente, não tive a honra de conhecê-lo. Contudo, falo de Dimas Macedo, que foi, com certeza, sua maior obra. O ilustre poeta, título que mais estima, herdou de seu pai não só características de personalidade como a simplicidade e a religiosidade, mas também o dom da escrita e o gosto pela poesia. Com um sorriso cativante, trata a todos como a um amigo, e com uma sensibilidade ímpar sabe interpretar e dar valor as coisas fundamentais da vida. Parabéns pela demonstração indubitável de amor, carinho e admiração que tens por teu pai.
ResponderExcluirAbç.