quarta-feira, 3 de abril de 2013

Acerca de Astrojildo Pereira



             Dimas Macedo




                                                                                  Astrojildo Pereira

             Se no Brasil, efetivamente, segundo o pensamento de Leandro Konder, houve uma derrota da dialética, pertinente à recepção das ideias de Marx, na primeira metade do século precedente, creio que essa assertiva não pode ser aplicada ao caso de Astrojildo Pereira.

         Autodidata de formação erudita, militante político aguerrido, estrategista da ação política de esquerda e crítico literário com excelente acolhida pelo nosso estrato acadêmico, Astrojildo Pereira passou para o escaninho da história como um dos nossos melhores ensaístas.

          Devemos a Astrojildo a fundação do Partido Comunista do Brasil (PCB), em 1922, e a manutenção do ideal socialista, entre nós, mas sem descuidar, esse vero pensador marxista, da sua filiação à causa comunista e ao discurso da ideologia democrática.

            Astrojildo Pereira nasceu em Rio Bonito (RJ). Foi anarquista na juventude e destacou-se, em 1913, como um dos promotores do II Congresso Operário Brasileiro, iniciando na imprensa de orientação marxista a sua carreira de jornalista e de agitador de ideias culturais de esquerda.

          Na sua produção de jornalista deixou o nosso Jildo a marca da sua consciência cultural. Foi redator do jornal A Causa Operária, órgão oficial do PCB, mas em 1931 desligou-se do Partido, passando a fazer crítica literária, ofício no qual se distinguiu, a ponto de ser considerado um Mestre da observação e da análise do texto.

             Como estudioso de Machado de Assis, revolucionou a interpretação e a estética da recepção da obra do grande escritor brasileiro, atentando para a singular conjugação de contrastes que marcou a vida tímida e sensual do nosso maior romancista.

             Em 1939, Astrojildo Pereira deu a público o seu ensaio pioneiro: Machado de Assis, Romancista do Segundo Reinado, no qual deixa transparecer a sua intuição de humanista e a sua cultura literária, chamando-nos a atenção para o fato de que o escritor é o desdobramento do homem, e que “em Machado de Assis coexistem e completam-se o analista rigoroso e frio e o criador empolgante”.

              Em 1958, o seu livro seria reeditado pela Livraria São José, do Rio de Janeiro, tendo a sua terceira edição sido publicada em 2008, pela Editora da Fundação Astrojildo Pereira, com o título sensivelmente modificado para Machado de Assis – Ensaios e Apontamentos Avulsos.

              O título e o conteúdo do livro foram modificados para atender a um fim: ao rigor com que o organizador da edição, Martin Cézar Feijó, esmerou-se em acostar ao texto original vários artigos escritos por Astrojildo, em diversas oportunidades, tendo Machado de Assis como objeto de reflexão.

              No prefácio escrito por Ivan Junqueira, especialmente para essa primorosa edição,  podem ser observadas as linhas de força da sua crítica literária e a exposição do rigor analítico com que o ensaísta minutava a sua metacriação no plano da cultura.

            Além dos anexos que foram recolhidos no final do volume, vinte e dois escritos avulsos do autor que foram acrescentados ao texto inicial, todos ao redor de Machado de Assis ou tendo como fundo a sua perspectiva cultural.

            O belo filme de Zelito Viana, intitulado A Última Visita e encartado nesta nova edição, empresta, com certeza, um brilho especial ao projeto. Refere-se Zelito à visita inusitada que fez o jovem pensador marxista, Astrojildo Pereira, ao Bruxo do Cosme Velho no seu leito de morte, e que não passou despercebida por Euclides da Cunha.

            Faço o destaque desse importante ensaio de Astrojildo Pereira especialmente com o fito de mostrar o quanto ele continua atual. E no mais eu gostaria de lembrar que os últimos estudos sobre Machado de Assis caminham exatamente em sua direção, isto é, revelam-se tendo como ponto de partida a perspectiva que Astrojildo colocou em debate.

              Astrojildo Pereira não foi apenas um militante político de esquerda: foi um grande crítico literário também. Um crítico literário integral. Um pensador marxista incomum. E um homem que fez da sua vida um exemplo de amor à causa social.

2 comentários:

  1. Saudosa época, fim do império e começo da república, em que coexistem os mais diferentes matizes de pensamento social, artístico e literário.A grande revolução russa incendeia as inquietas mentes dos trópicos. nesse contexrto, eclode Astrojildo Pereira, militante de esquerda, ensaísta e crítico literário ímpar. Contribui extraordinariamente para a difusão do ideal socialista ao fundar o PCB, Partido Comunista do Brasil, o qual se desfiliaria para exercer o ofício que o distinguia, a análise literária. Ensaísta da melhor estirpe, teve Machado de Assis como inspiração maior. Em Jildo coexistem paradoxais qualidades, a paixão do militante e a minúcia do literato, que só as grandes figuras são capazes de comportar. Se a matéria se foi, as ideias e a dedicação à Alta Literatura sobrevivem e servem de inspiração para as gerações posteriores, que tem em Jildo o exemplo de dedicação ao social e rigor analítico em favor da literatura.

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  2. Prezado Mateus Barreto, grato pelo seu lúcido comentário acerca da minha postagem sobre Astrojildo Pereira. Forte abraço.

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