Raimunda Neide Moreira Freire era
neta, por via paterna, de Manuel Rufino de Sousa Moreira e de Maria Ferreira de
Jesus, sendo seus avós maternos, Júlia de Oliveira Sales e Possidônio de Oliveira
Wanderley, os quais se estabeleceram, por algum tempo, no município de São
Braz, às margens do Rio Purus, ainda durante a febre da borracha.
Sua mãe, Laura de Oliveira Moreira,
era natural de Iguatu, e seu pai, o eletricista-mecânico Isaías Moreira, era filho
da cidade de Senador Pompeu. Transferiram-se, em 1923, para Lavras da
Mangabeira: ele, para ali instalar um Cine-Teatro, a convite do Coronel João
Augusto, então prefeito da edilidade.
E justamente ali, na margem esquerda
do Salgado, nasceu a menina Neide, a 23 de maio de 1924, ano em que o Rio
transbordou e destruiu parte da pequena urbe cearense, inclusive o Cine-Teatro
instalado pelo seu genitor.
Neide recebeu o sacramento do
batismo na Igreja Matriz de sua terra natal, tendo por padrinhos, Alfredo
Barreto e sua mulher, dona Maria Barreto, naturais de Iguatu. Sua madrinha de
crisma foi dona Lica Barros, filha de Manuel de Barros, antigo Intendente
daquele município.
Passou a infância na rua mais
ribeirinha e vulnerável à possessão das águas do Salgado – a Xavier Ângelo,
conhecida por Rua dos Cassacos. Lembrava-se, sempre com muita perfeição, de
vultos da infância com os quais a sua família interagiu: José Rodrigues Paiva,
Pedro Tavares Filgueiras, Rita Saburá e Joaquim Lobo de Macedo, avô, este
último, de José Zito de Macedo, seu colega no Grupo Escolar daquela localidade.
Recordava-se também que seu pai se
empenhava, ao máximo, na manutenção dos engenhos de cana e usinas de algodão do
município, capitaneadas por Mário Augusto de Oliveira (Mário Borrego), Emar
Mattos Rolim e Eugênio Augusto de Almeida.
Foram seus primeiros professores, ainda
na terra de berço, João Augusto Banhos e José Luiz da Silva Ramos. Depois ela
estudou no Grupo Escolar da velha Princesa do Salgado, então dirigido por Maria
Luiza Lima e tendo como professoras Guiomar de Holanda Férrer, Neuza Ceará e
Isa Gondim Santos.
Realizado o curso primário, entre 1930
e 1935, fez em seguida os preparatórios para o exame de admissão, cursando o
ginásio no Colégio Santa Teresa de Jesus da cidade do Crato (1936). Em
Fortaleza concluiu o secundário (1937-1939) e o curso normal (1940-1941),
diplomando-se Professora Normalista aos 08 de dezembro desse último ano.
Fez curso de reciclagem para
professores, em 1969, a cargo da Secretaria de Educação do Estado, e de
Atualização em Literatura Infantil, na Academia Cearense de Letras. Em São
Paulo, no Instituto Brasileiro de Estudos Sociais, realizou o Curso de Didática
de 1º e 2º Graus (1973), e ali se bacharelou em Teologia, pela Faculdade
Universal de Teologia de São Paulo, em 1986.
Em 1942 iniciou-se no magistério
público estadual na cidade de Ibiapina, lecionando nos anos de 1947/1948 no
Patronato Dona Maria Luíza e na Escola Normal Rural da cidade de São Benedito,
ambos dirigidos pelas Irmãs de Caridade.
Em 1949, transferiu-se para Ubajara,
onde dirigiu, durante 15 anos, a Escola de Ensino Fundamental Grijalva Costa.
Aposentando-se do magistério (1973), assumiu, em 1981, a direção do Complexo
Educacional Francisco de Oliveira Moura, pertencente ao DNOCS e instalado no
perímetro irrigado Curu-Paraipaba.
Escritora de fino trato para com o
amanho das letras, Neide é autora dos livros: Acendalhas (Piracicaba/SP:
Serviços Gráficos Degaspari, 1987) e Poemas e Lembranças (Fortaleza:
RDS, 2008).
Em Fortaleza, foi coordenadora da Revista
Jangada, da Ala Feminina da Casa de Juvenal Galeno, instituição que
presidiu no período de 13 de setembro de 1992 a 13 de setembro de 1996.
Foi integrante da Associação de Jornalistas e
Escritoras do Brasil (AJEB), da Academia Lavrense de Letras e da Academia
Feminina de Letras do Ceará (esta última como sócia honorária), e sócia-correspondente
da Academia Irajaense de Letras (RJ) e da Academia Literária Feminina do Rio
Grande do Sul (RS).
Participou de uma dezena de livros
publicados no Ceará e em outros Estados e recebeu diversas medalhas e troféus.
Em 2004, foi homenageada pela Assembleia Legislativa do Ceará, no Dia
Internacional da Mulher, tendo falecido em Fortaleza aos 10 de maio de 2018.
Este percurso biográfico distingue, para os
seus leitores, a vida de uma escritora de talento, e encontra-se recolhido no
meu livro Novos Lavrenses Ilustres
(Fortaleza: Expressão Gráfica, 2016. Com ele, prestei as minhas honras a uma
das mulheres mais dignas do Ceará e creio que fiz justiça à sua trajetória de
poetisa, professora e educadora.
Agora, sou convidado por Francisco Rodrigues
Freire Filho para fazer a apresentação deste livro, Um Pouco Poesia / Um Pouco de Memória (Fortaleza, 2019), no qual
ele reuniu os dispersos de Neide e juntou as suas letras pejadas de fina
rigidez formal e de estética literária que chamam a atenção, fazendo, desta
forma, uma grande homenagem à sua inesquecível mãe.
O livro reúne um conjunto de escritos,
publicados e inéditos, com os quais Neide Freire evoca as suas lembranças, expondo
a sua mestria e abrindo seu coração para o Amor, a Esperança e a Fraternidade,
valores que sempre difundiu entre os seus alunos e partilhou com os seus amigos
e admiradores.
A sua produção de poetisa acolhe, em
suas linhas, os sentimentos da autora, mas o que trescala do seu texto poético,
é a escansão melódica dos seus versos e o acento gramatical com que ela costura
seus poemas.
No campo da prosa, Neide também expõe o seu
talento e mostra-nos o quanto é sutil o seu universo criativo, todo ele marcado
pela serenidade, a humilde e pela devoção à arte literária e aos seus elementos
de maior destaque.
Cristina
Couto, ao escrever a apresentação deste livro, destacou o seu papel de artesã
da palavra ritmada e da palavra fundadora do belo, ficando-me de último a
impressão de que aqui eu pago o meu tributo maior à sua memória.
Fortaleza, 13 de maio de
2019